Göttinger Predigten im Internet
hg. von U. Nembach

Décimo Sexto Domingo após Pentecostes– 19 de setembro de 2004
Lucas 14.25-33 – Gerson L. Flor

(Sermões atuais: www.predigten.uni-goettingen.de)


25 Grandes multidões o acompanhavam, e ele, voltando-se, lhes disse: 26 Se alguém vem a mim e não odeia a seu pai, e mãe, e mulher, e filhos, e irmãos, e irmãs e ainda a sua própria vida, não pode ser meu discípulo. 27 E qualquer que não tomar a sua cruz e vier após mim não pode ser meu discípulo. 28 Pois qual de vós, pretendendo construir uma torre, não se assenta primeiro para calcular a despesa e verificar se tem os meios para a concluir? 29 Para não suceder que, tendo lançado os alicerces e não a podendo acabar, todos os que a virem zombem dele, 30 dizendo: Este homem começou a construir e não pôde acabar. 31 Ou qual é o rei que, indo para combater outro rei, não se assenta primeiro para calcular se com dez mil homens poderá enfrentar o que vem contra ele com vinte mil? 32 Caso contrário, estando o outro ainda longe, envia-lhe uma embaixada, pedindo condições de paz. 33 Assim, pois, todo aquele que dentre vós não renuncia a tudo quanto tem não pode ser meu discípulo. (Tradução de João Ferreira de Almeida Revista e Atualizada.) 

Seguindo a Cristo

Nada como a palavra dita a seu tempo. Uma boa palavra dita no momento certo, da forma certa, tem o poder de curar mágoas, fortalecer amizades, despertar amor. A mesma palavra, porém, usada fora do seu tempo, pode ter efeito devastador. Por exemplo, a seguinte frase: “Mas que grande notícia, isto merece uma festa!” Dita por ocasião de alegria para a outra pessoa (promoção no trabalho, casamento, nascimento de uma criança), a frase será recebida com gratidão; dita por ocasião de tristeza ou pesar (perda de um familiar, demissão do emprego, revés nos estudos), soará como ofensa ou insulto.

Também as palavras do Salvador Jesus eram palavras ditas com propriedade, a seu tempo e modo, de acordo com a necessidade do ouvinte. Ao contrário dos provérbios que usamos no dia a dia, as palavras de Jesus não podem ser usadas livremente, em qualquer contexto. Algumas de suas palavras funcionam apenas dentro do contexto no qual foram proferidas, e fora daquele contexto acabam por dizer algo completamente distinto.

Em nosso texto, por exemplo, encontramos algumas palavras que requerem atenção especial. Embora o texto seja exclusivo do evangelho de Lucas, os vv. 26-27 ressoam, com pequenas variações, em diversos outros contextos nos evangelhos sinóticos. Jesus as usa como instrução aos doze após a sua escolha (Mt 10.37-38), junto à predição da sua morte após a confissão de Pedro (Lc 9.23), após a conversa com o jovem rico (Lc 18.29-30). A questão é em que ocasião, e com que propósito, Jesus usa esta frase no texto de hoje.

Jesus encontra-se a caminho (13.22). A caminho de Jerusalém. A caminho da morte na cruz. Mesmo assim, as pessoas continuam vindo até ele. O que elas querem? Elas querem vê-lo, ouvi-lo, tocá-lo, serem curadas, presenciarem milagres, etc. Muitas pessoas vêm até Jesus por estarem convencidas de que ele é um profeta ou mesmo o Messias; essas pessoas querem segui-lo, ir após ele – algumas com boas intenções, outras nem tanto. Muitos queriam bajulá-lo, garantir algum benefício pessoal imediato.

Claro, muitos acreditavam que Jesus ia a Jerusalém para reclamar o trono de Davi. Se ele are o Messias, como muitos o diziam, ele haveria de derrotar aqueles que usurpavam o reino e mantinham Israel sob domínio pagão. Muitos queriam um lugar especial na sua corte, por isso estavam dispostos a largar tudo e segui-lo. Não se tratava de sacrifício, mas de um grande investimento!

Jesus avisa às pessoas que não se enganem: segui-lo dali para a frente não é tarefa fácil. Quem quiser mais do que vir até Jesus, quem quiser acompanhá-lo em sua jornada e sua missão, deve estar preparado para ir até as últimas conseqüências. “Seguir a Jesus”, aqui, não se trata de uma figura de linguagem, significando crer na sua obra redentora, ouvir a sua palavra, buscar a Deus e o seu reino. Jesus fala aos que queriam juntar-se a ele em sua caminhada rumo a Jerusalém.

Voltando-se para aquelas pessoas, Jesus disse: “Qualquer que não tomar a sua cruz e vier após mim não pode ser meu discípulo.” Ao falar em cruz, Jesus deve ter causado arrepios nos que o ouviam. A cruz, naquela época, não era o símbolo religioso que veio a ser após a sua morte. Ninguém jamais pensaria em pendurar no pescoço uma cruz, fosse de madeira ou mesmo de ouro. A cruz era um instrumento de morte bem conhecida e temida na época de Jesus. Reservada para bandidos e assassinos, a cruz inspirava terror, maldição.

Logo, ao falar em tomar a sua cruz, Jesus não fala de sofrer “as durezas da vida,” “o destino de cada um,” como muitos hoje o entendem. Jesus fala em estar preparado para enfrentar sofrimento real, prisão, inclusive a própria morte, por confessar publicamente seu apoio a Jesus. Nós sabemos que nem mesmo os doze discípulos foram capazes de fazer isso; que diria então o povo das aldeias que vinha até Jesus sem saber o que o aguardava!

Antes de mencionar a cruz, Jesus já usara palavras extremamente duras: “Se alguém vem a mim e não odiar a seu pai, e mãe, e mulher, e filhos, e irmãos, e irmãs e ainda a sua própria vida, não pode ser meu discípulo.” Esta é a única passagem em que Jesus fala em odiar as pessoas mais próximas. Muitas traduções procuram amenizar o termo, substituindo “odiar” por “aborrecer” ou “amar menos”. O que dizer dos ouvintes de Jesus, que não tinham traduções para atenuar suas duras palavras?

Sem dúvida, a linguagem de Jesus escandaliza. Será preciso odiar a família e a si mesmo para segui-lo? É evidente que Jesus não quer que odiemos as pessoas; isso contradiria todo o seu ensino. O próprio Jesus ensinara, “amai os vossos inimigos,” e deu exemplo quando da cruz orou pelo perdão dos que o crucificaram. As pessoas que seguem a Jesus são freqüentemente vítimas, e não sujeito desse ódio (cf. Jo 15.18-25).

Ao falar em ódio, Jesus quer chocar a audiência. Ele não fala aos seus discípulos, a quem ele escolhera para o seguirem até o fim. Voltando-se para trás, Jesus fala especificamente às multidões que querem segui-lo irrefletidamente.

As comparações com a construção da torre e com o rei que sai para guerrear só aparecem no evangelho de Lucas. E se observarmos bem, veremos que Jesus critica apenas quem constrói a torre ou sai à guerra sem planejar antes. Nenhuma crítica é feita a quem, calculando antes, conclui não poder concluir a torre ou vencer a guerra. Isto mostra que Jesus não espera que todas as pessoas presentes o sigam – antes pelo contrário, é preciso desincentivá-las, por uma questão de amor, por só ele saber das dificuldades que o aguardavam naquela jornada. Como Gideão, Deus precisa de poucas pessoas, porém preparadas.

Para compreender a mensagem de Jesus, precisamos tomar o termo “odiar” com toda a sua força. Jesus o usa como último recurso para que as pessoas da localidade desistam de acompanhá-lo. Suas palavras querem dizer: “Se alguém insiste em ir comigo a Jerusalém, certamente odeia seus familiares e a sua própria vida”.

Jesus fala com uma preocupação pastoral pelas pessoas que pretendem acompanhá-lo. Prova disso é o que ele fala antes e depois do nosso texto. Tanto a parábola da grande ceia quanto as parábolas do capítulo 15 mostram que Deus faz de tudo para que nenhuma pessoa que lhe pertence se perca. Certamente não é por acaso que estas parábolas enfatizam cenas comuns, do dia-a-dia do povo simples das aldeias da Galiléia: o boi ou filho que cai em um poço, um banquete, o pastor que busca a ovelha perdida, a moeda encontrada pela mulher ao varrer a casa. Era para aquelas pessoas simples, que viam nele o Ungido de Deus, que ele falava, com o amor e a preocupação que só o Bom Pastor comhece.

Jesus sabia que precisava de pessoas que dessem testemunho de suas obras também ali naquela aldeia por onde ele passava. Este tipo de discipulado não era menos importante do que o daquelas pessoas que o seguiam em direção a Jerusalém. O cuidado com esposa, crianças, pai, mãe, irmãos e irmãs e consigo mesmo é igualmente algo agradável a Deus. Tal cuidado é uma conseqüência do mandamento de amar ao próximo, algo de que Jesus de modo algum nos libera (Mc 7.11-13).

O amor para com aquelas pessoas que repartem o dia-a-dia conosco é também um modo de seguir e servir a Deus, no lugar onde vivemos, entre as pessoas que nos amam, a quem amamos e de quem precisamos cuidar com amor. Quem age assim não pode ser culpado (1Jo 2.10). Se não amarmos a essas pessoas, de modo algum poderemos verdadeiramente amar a Deus (1Jo 4.20). Também nesta tarefa o Espírito Santo move-nos a agir como discípulos de Jesus.

Jesus não condena os que não o seguem; ele apenas pretende restringir o grupo dos que vão com ele a Jerusalém. Isto é mais uma atitude do seu amor inesgotável pelos seres humanos – por aqueles que, sem condições de enfrentar as dificuldades da viagem, acabariam dispersos, e por aqueles que ficariam desamparados com a falta dos seus queridos.

Como seguidores de Cristo em uma época distante daquela em que o Salvador esteve entre nós na carne, é preciso que as palavras de Jesus sejam meditadas profundamente. Muitos cristãos, no afã de seguirem a Cristo exemplarmente, descuidam das pessoas a quem prometeram, na presença de Deus, amar, consolar, honrar e amparar em dias bons e maus enquanto vivessem. Por querermos ser exemplares no serviço do Senhor, corremos o risco de desamparar o marido, a esposa, os filhos, pais, irmãos e irmãs. Não nos deixemos enganar: não pense que presta bom serviço quem, para dedicar-se ao Reino de Deus, põe de lado a própria família. Lembremos a mensagem da torre inacabada e do rei que sai para a guerra: melhor teria sido sentar e calcular antes de iniciar a caminhada.

Amiga, amigo, Cristo lhe chama ao arrependimento e à fé. Pela graça do Pai, o Espírito Santo lhe chamou e deu nova vida em Cristo Jesus. Viva essa nova vida, seguindo o Salvador no lugar em que você vive e entre as pessoas que Deus colocou sob o seu cuidado. Ali Deus lhe mostrará o caminho a trilhar, à sombra da cruz, rumo à eternidade reservada aos que crêem no Salvador Jesus Cristo. Amém.

Rev. Gerson L. Flor
Lutheran Church - Canada
Georgetown, ON, Canada
gflor@cogeco.ca


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