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ISSN 2195-3171





Göttinger Predigten im Internet hg. von U. Nembach

23º Domingo após Pentecostes , 31.10.2010

Predigt zu Mateus 10:26b-33, verfasst von Luís Henrique Dreher

Dia da Reforma

 

Querida comunidade, queridos irmãos e irmãs em Cristo!

O que significa para nós, hoje, saber de Deus e do mistério que ele nos revelou e ainda revela? O que significa, hoje, ter que contar adiante, até as últimas consequências, o segredo contado pelo Filho, de Nosso Senhor Jesus Cristo?

Mais ainda: o que significa hoje, para nós, ter medo de uma maneira concreta, natural? E o que significaria ter medo e vencer o medo de uma maneira mais que natural, talvez: sobrenatural?

Finalmente: o que pode ainda significar hoje, para nós, perder a nossa alma?

São tantas as perguntas, e tão difíceis as respostas! O único consolo que parecemos ter é que, nos tempos calmos da vida, na normalidade da maioria dos domingos da nossa vida, tanto as perguntas como as respostas difíceis seriam adiáveis. Especialmente nos dias dedicados a Deus, e mais ainda quando podemos vivenciar mais de perto a comunhão com os irmãos e irmãs em Palavra e Sacramento, unidos pelo Espírito Santo, parece que ganhamos tempo e alívio de nossas aflições.

Sem dúvida, eis aí uma parte da verdade. Ganhamos tempo porque na comunhão dos santos obtemos respostas de maneira concreta, vivida, às nossas inquietações particulares e medos cotidianos. Sim, é bem verdade: ganhamos tempo, um tempo mais pleno até, um tempo que é também vívido e vivificante, pois que gracioso e amoroso. Nesses momentos de culto, nossas próprias urgências, se é que vêm nos atribular por alguma distração ou pela monotonia da prédica, têm a ver com outras áreas da vida. Como o ganho do sustento. Ou a correria da vida profissional e urbana. Ou as contas a pagar a partir da próxima segunda.  

Temos urgências, e seu alívio buscamos. E o achamos, também e especialmente no convívio cristão. Mas o texto de nossa pregação de hoje, do evangelista Mateus, fala de urgências de outra ordem e de outra envergadura. Não que nossas urgências e emergências cotidianas não sejam por ele necessariamente desconsideradas. Também os discípulos, antes de serem enviados, tem que fazer preparativos, seguir instruções, cuidar das questões práticas, "correr atrás".

Mateus nos diz, porém, que a verdadeira urgência é a de confessar vivendo e viver confessando uma lealdade fundamental ao que foi revelado por Deus, e que não está mais encoberto. Trata-se da aproximação e da vinda de Deus em Jesus. Esta é atestada pelo vínculo indissociável entre a humildade da cruz, narrada implicitamente como que em "cenas dos próximos capítulos", e a vitória da ressurreição, já experimentada no vínculo do Espírito. Essa lealdade a quem Deus é realmente, e ao seu modo de mostrar-se como realmente é, torna-se um acontecimento em Jesus. Mais: torna-se um evento na linguagem cristã que cria realidade e produz bons frutos.

Deus se faz finalmente presente só no estímulo aos atos públicos, na atividade missionária que de contar o segredo da boa notícia, o segredo da graça que chega e chegará. Este segredo insta, urge, mas também estimula, consola e promete. Sua divulgação não foi liberada de uma vez por todas por poderes mundanos, mas pelo próprio Jesus, que é o Senhor e é o Filho. Assim, a urgência do evangelista Mateus é aquela que congrega. É a urgência da confissão dos discípulos, e, além disso, e fundamentalmente, a instância a não temer. Não ter medo de sempre viver e fazer confissão, enquanto ainda vivemos no tempo "antes" de nosso fim natural, bem como de todos os fins e tempos estabelecidos por Deus.

Para o evangelista, importante na confissão é que ela seja pública. Ela tem que aparecer à luz do dia, deixando de ser secreta. Eis aí o espírito e a essência da própria Reforma em seu aniversário. Eis aí o núcleo da pregação dos reformadores, reencontrado nas origens do texto bíblico.

Em nosso caso, o texto do Evangelho de Mateus. Nele, os discípulos não estão sós, nem sozinhos, nem só em família. Eles são já a igreja em estado de nascimento, e sua tarefa é confessar o que é essencial, sempre segundo os modos e as boas maneiras instituídas pelo Senhor. A igreja, já ali, em estado de nascimento, tem, pois, uma urgência que lhe é própria, que é só dela: confessar publicamente, "à plena luz". E se ela por um só momento se despede dessa urgência, parando de observar todas as tarefas da confissão, que incluem a pregação, o serviço e o teste exigente da comunhão, ela congela. Ela se deixa vencer seja pelo medo, seja pelos apetites naturais ou pela mera busca de alívio e consolo, por mais importante que esta seja.

Nesse caso, porém, ela precisa de novo ser reformada, e o que se comemora no Dia da Reforma é no fundo muito simples. Não se trata no mínimo de eventos heroicos, ou pior ainda, de episódios históricos há muito ocorridos. Trata-se, com a Reforma, apenas de despedir-se constantemente do medo, confessando publicamente o evento revelador na linguagem que lhe é própria, e em ambientes que nem sempre são amigáveis. Não causa espanto, assim, que com frequência o espírito reformatório se ache antes em hóspedes e eventos inesperados do que em lugares familiares. A reforma já é, pois, ecumênica: quando verdadeira, é de todos os cristãos, e quando eficaz, interpela-os a todos como que vinda "de lugar nenhum".

Mas voltemos à palavra do evangelista. O tempo de Mateus é de urgência. É sobretudo o tempo de deixar diáfano e claro o segredo contado por Jesus. Não há que ter medo dessa urgência, ela não é desagradável, tampouco traria a mais desagradável das consequências. É por isso que nossa passagem bíblica é introduzida com o anúncio do conteúdo proclamado por Jesus, mas antecipado pela palavra asseguradora do evangelista: "Não os temais". A expressão "não temais" é repetida mais duas vezes dentro da nossa perícope, uma delas com referência àqueles que têm apenas o poder de matar o corpo; e outra, numa formulação já absoluta: "Não temais pois!" Noutras palavras, a promessa contida na fala de Jesus é que o medo que todos conhecemos, o medo ligado às emergências de nossa estância na terra, e mesmo o medo da própria morte violenta, não é nunca a palavra final. Os medos naturais, dos quais é impossível nos livrarmos totalmente, seja com pequenas ou grandes estratégias médicas e de engenharia social, não haverão jamais de prevalecer. A promessa divina, que produz a capacidade nela confiar, declara de forma patente que nenhuma classe de medo haverá de impor uma derrota definitiva aos que creem. Trata-se de uma promessa ousada, mas não é meramente humana se bem ouvida.

Para Mateus, os que creem na comunhão do Espírito Santo, já creem que Jesus é o Cristo, o Filho do Homem; o tão esperado Messias sobre o qual agora não há mais segredos. Para o evangelista, o mistério é mais que enigma de palavras, ou algo de que se teria uma noção distante apenas. É promessa de uma vida que está por ser revelada mais e mais, até o fim e de uma vez por todas. De uma vida verdadeira, que vale plenamente a pena. Pois já a pergunta acerca de quem é Deus e daquilo que ele nos revela foi respondida por Jesus! Para Mateus, Jesus responde, através do mandamento do amor, ao mistério da lei e de seu cumprimento. Ele é o Messias a ser reconhecido como o conteúdo pleno do que Deus revela para de novo aproximar-se dos seus, de uma vez por todas - e Deus quer que todos, sem exceção, sejam seus. Jesus mesmo é o conteúdo do que estava "oculto", mas é e será mais "conhecido". Pois sua vida, pensamento e ação são a corporificação resumida do que é o reino, o governo soberano e completo de Deus, que é amor. Para Mateus, essa mensagem é universal, sendo primeiramente dirigida aos judeus, mas daí se estendendo a todos os povos, tempos e lugares.

Diante da urgência de confessar, seria preciso, pois temer de outro modo, mais profundo e radical do que tememos todos os dias, no trânsito, nas grandes cidades. Que ousadia! Parece um insano, este Mateus! Será que ele nunca sonhou com andar à noite na periferia desconhecida de uma grande cidade brasileira para saber o que é medo? Será que podia sequer imaginar o medo de uma bala perdida, ou de um arrastão de marginais numa via expressa?

Mas não é Mateus quem fala, ou ao menos ele não fala por seu próprio poder. Ele sabe de novo de uma maneira radical, talvez quase esquecida nas primeiras alianças propostas por Deus, que o risco maior é o de perder a nossa alma. Na verdade, correr este risco é que é, para ele, uma loucura incomensurável com todas as demais. E não precisamos nem discutir sobre a essência da alma - por exemplo, acerca de se ela é ou não uma substância - para saber que, para os antigos em geral, ela é a palavra maior para a "vida verdadeira". Pois na alma dos humanos, e mais ainda dos cristãos, cristaliza-se a vida que, no dizer de Cícero, é aquela "vida que unicamente deve ser chamada vida" - vita quae sola vita nominanda.

Logo, para Mateus, os temores que fazem parte da nossa vida de membros da boa criação divina não são os mesmos temores que fazem parte de nossa vida como membros da comunhão dos santos. Não que nós possamos ou devamos desvencilhar-nos ou negar nossos medos naturais, grandes ou pequenos, e nossas urgências e emergências cotidianas. Antes, também a nossa vida biológica foi ordenada por Deus de tal modo que a Ele sirvamos e aos seus propósitos. Mas este serviço e estes propósitos aparecem em sua total visibilidade na vida e nas promessas de Jesus, o Cristo. O serviço é a confissão destemida, e o propósito é a preservação e expansão da vida verdadeira. Esta, por ser pura dádiva divina concretizada na vida e obra de Jesus de Nazaré, plenifica a vida natural. Vai reconduzindo, assim, o gênero humano à integridade da imagem divina, acabando de uma vez por todas com todos os medos.

É por causa desta imagem a ser restaurada que para Deus o ser humano tem um valor inigualável, valendo "bem mais do que muitos pardais". O evangelista nos lembra de que não é a sorte dos caçadores, ou ainda sua boa pontaria, que faz cair o pardal. Este Deus que tem autoridade e que determina cada detalhe da nossa vida natural, até mesmo a quantidade de nossos fios de cabelos - embora haja lenitivos e simulacros para o fenômeno da calvície -, convida-nos à sabedoria e a ponderação. Ao lado de tantas outras e complexas facetas suas, Jesus foi também um sábio, ao mostrar esta autoridade e soberania divina sobre a natureza e nossa vida biológica.

Mas é num outro ponto que reside a possibilidade de superar o temor natural da morte, pois mesmo o mais sábio dos sábios poderia no máximo isolar-se dos medos, nunca superá-los por si próprio. Jesus foi e permanece, para os cristãos, sendo mais que um mero sábio. Ele é o Cristo, o Filho, que veio proclamar a vida verdadeira. É o filho do homem que no mesmo fôlego se comprova como o filho de Deus. Pois ele se apresenta como o resumo e a epítome da vida verdadeira, e dá-nos o poder de crer que assim de fato é. Ele cria, pelo seu Espírito Santo, a capacidade mesma de confiar na promessa divina que garante o livramento do juízo, ou seja, da morte. Dá-nos o poder de não ter medo de confessar que há, sim, uma vida verdadeira. É isso que no fundo cabe-nos confessar. E é só na integridade dessa confissão que a igreja, que é de todos os que confessam Cristo do modo por ele instituído, vive "Reforma". Esta, agora, é definitivamente um bem de todas as igrejas cristãs na medida em que revela a sua essência íntima: "reformar", isto é: não temer a exigência amorosa e a urgência poderosa de confessar à plena luz.

Que Deus nos ajude a nunca negar a vida verdadeira manifesta na comunhão dos santos pelo poder do Espírito. Que o convívio vivificador dos cristãos mediante palavra e sacramento possa sempre estimular a confissão integral de Jesus, Deus-conosco que de nós se aproximou de forma radical e definitiva. Que a igreja sempre possa auxiliar a tantos que, acossados por falanges de medos, estão em perigo de perder as formas da boa vida criada por Deus. E que, junto com isso, a igreja se deixe sempre reformar, aceitando ser instrumento, ainda que frágil, dos milagres divinos pelos quais sempre há tempo para uma alma perdida se reencontrar.



P. Luís Henrique Dreher
Juiz de Fora, MG, Brasil


E-Mail: luis.dreher@ufjf.edu.br

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