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ISSN 2195-3171





Göttinger Predigten im Internet hg. von U. Nembach

9º Domingo após Pentecostes, 10.08.2014

Predigt zu Mateus 14:22-33, verfasst von Luís Henrique Dreher

Querida comunidade, queridos irmãos e irmãs em Cristo!

Quando lemos e ouvimos, vez após outra, este texto do Evangelho de Mateus, logo nos identificamos com os doze, com os discípulos amedrontados num barquinho açoitado, torturado mesmo pelas ondas e pelo movimento ruidoso do vento, lá dentro do mais escuro da noite. A identificação é imediata e automática. Pois muitas vezes já ouvimos, noutras pregações, que o barco é a igreja de Jesus Cristo, do Senhor, do próprio filho de Deus. E que ela vai singrando pelo mar, velejando em meio a perigos, a tempestades, mas rumo aos horizontes amplos, estes sim definitivos, do reino de Deus e da paz verdadeira.

O medo, certamente um dos mais humanos de todos os sentimentos, persiste ainda, tanto no barco como na igreja - e  não poderia ser diferente - também para os que já são cristãos. Pois temem, também, os que já creem na salvação e na redenção de toda e qualquer vida frágil e desorientada. Somos ainda seres que tememos de tudo um pouco, às vezes mais que ao próprio Deus, cujo temor significa, isto sim, a inversão do temor: significa o mais puro e abrangente amor. Mas é assim porque sozinhos, por nossa própria conta, não conseguimos, de jeito nenhum, fazer toda a travessia. Na maioria das vezes, sequer, ou mal e mal, conseguimos começar. Sabendo disso,  não é no "ter medo" que os cristãos seremos diferentes. Todos temos "um pouquinho de medo", como sinceramente confessam os meninos - mais os pequenos e espontâneos que os já crescidos. Mas como cristãos, somos e poderemos ser, isto sim, diferentes noutra coisa: em algo mais importante, embora não menos difícil, por não vir tão naturalmente: a esperança.

Cristãs e cristãos, porém, nunca esperam e creem ainda o suficiente, nem na promessa de que Deus de fato mandaria seu Messias, de fato um Senhor. E de que enviaria alguém mais próximo de si do que qualquer profeta, e mesmo mais próximo de Deus do que o último deles: João Batista. Somos ccristãos que, por si sós, somente cremos um pouquinho, mas nunca naquela dosagem absolutamente imprescindível e que, sozinhos, não podemos suprir. Que de fato não alcançamos tal fé, ao menos se não formos socorridos pelo Senhor da vida e da criação, cujo poder e maravilhas faz até ... imaginem vocês ... caminhar sobre as águas.

"Que ma-rra-vilha!" "Que ma-rra-vilha!" - como costuma dizer, com forte sotaque, um chefe de culinária francês num português quase brasileiro, e por certo mais do que suficiente para as lides que produzem, no universo menor da cozinha, lá seus milagres gastronômicos. Imaginem: um Jesus poderoso, milagroso, que caminha sobre as águas! Quase aquele cantado no poema do espanhol Antonio Machado: "Quem me empresta uma escada/para subir à cruz de madeira/para tirar-lhe os cravos/de Jesus, o Nazareno?"  Pois este Jesus na cruz, continua o poeta, não é o que ele quer, nem o que canta: "Ó, não és tu o de meu cantar!/Não posso cantar, nem quero/este Jesus da cruz de madeira/mas sim o que andou sobre o mar!"

Que versos poderosos! É compreensível a busca do poeta pelo Jesus poderoso e maravilhoso, quando tantos haviam já glorificado, quase idolatrado, o sangue e a dor, mais mesmo do que Jesus, o Cristo, Filho de Deus. Mas a verdade é que, no caso de Jesus ao menos, o Senhor poderoso e maravilhoso não anula, de nenhuma maneira, aquele que por nós padeceu e morreu na cruz. O Jesus que caminhou sobre o mar, estava atravessando de volta por outro caminho, mas contra todo o bom-senso, rumo à capital de Herodes e, por fim, rumo ao centro de poder político e religioso: Jerusalém.

Para nós, os versos do poeta que quer só "o Jesus que andou sobre o mar" apenas colocam em perspectiva o Jesus que por nós se entrega, em obediência a Deus: não foi uma morte inútil, não foi qualquer dor, não foi qualquer sangue. Foram a dor e o sangue valiosíssimos Daquele que tinha a maior intimidade possível com Deus, e que assim viveu e morreu por um propósito. Um propósito que inclui a salvação de todos os que têm medo, mas aceitam a mão estendida, que esperam a redenção de toda e qualquer vida frágil e desorientada.

E nós? Bem, mesmo depois de uma maravilha dessas, buscamos refúgios em explicações do tipo: "Teria sido um fantasma?". Mesmo depois da verdadeira maravilha da palavra asseguradora: "Tende bom ânimo, sou eu, não temais", nós dizemos, como Pedro: "Senhor, se és tu, manda-me ir ter contigo por cima das águas." E se atentamos bem a estas últimas palavras, a iniciativa daquele que era talvez o mais distinto, mas também o mais contraditório dentre os discípulos, Pedro, chega a desanimar, de tão pouca que era. Já veremos.

 "Homem de pouco crer e de pouco confiar," é assim que o Senhor acaba retrucando a Pedro. Não que Pedro, o apóstolo, fosse cético, ou descrente. Afinal, ele já está dentro do mesmo barco, não é verdade? E pelo menos ele fala algo; pelo menos se dispõe a adquirir a confiança para dar o primeiro passo. Na verdade, age quase como uma criança pequena que, depois de engatinhar por muito tempo, se arrisca e começa a arriscar-se, por instinto. A criança levanta as perninhas. Cambaleia. Olha e espera uma mão estendida para aquilo que, para todo pequenino, parece sempre uma enorme travessia de um enorme mar ou deserto. (Mesmo que seja apenas o trajeto de um sofá a outro na sala de estar!)

Mas Pedro, sabemos, já não é uma criança. Ele fala, é certo. Mas reflete demais. E aí duvida porque vacila e seu vacilo e hesitação é toda sua dúvida. Pronuncia um "se" fatal em "se és tu", mesmo depois de Jesus ter dito com toda sua autoridade, que era ele mesmo, e quem ele é, que ele é quem ele é; e que não haveria, de fato, espaço para mais temor, agora não mais.

Mais ainda: Pedro, talvez não tanto por obediência e respeito, mas por causa de sua própria falta de iniciativa no que mais importa na vida - a salvação -, pede a Jesus ordenar-lhe que vá ter com ele "por cima das águas". É tão humano este gesto! Por certo o conhecemos. Pois é de tudo o mais difícil assumir esta iniciativa importante por conta própria. É uma decisão difícil, o desafio de uma decisão que, no caso dado, poderia terminar em afogamento. Sem um olhar e a garantia de uma mão estendida vindo do lado de lá, são mínimas, ou inexistentes, as chances de sucesso. Começa-se então a descer ao fundo, ao abismo, ao lugar do nada, ao vazio de águas profundas.

Sabemos dos perigos do mar, nós que temos oceanos e praias e que os buscamos para puro lazer nos verões calorentos e abafados. Buscamos ali, em caravanas e excursões, a brisa e o frescor das águas, e contamos sempre com  a presença benfazeja dos salva-vidas. E mesmo assim muitos afundam, por acidente, por falta de cuidado. Assim, não é fácil criticar Pedro, não acham? Quem não tem medo de afundar? E: com mar bravio, sem salva-vidas profissionais nas proximidades?

Jesus, o Senhor, é nessa história, no fim das contas, a personagem que nos mostra como o medo foi vencido. E ele é o salva-vidas real e mais imprescindível. Ainda inaparente, talvez, mas não um fantasma, e muito menos um mágico. Após ter-se afastado dos lugares mais populosos da Galileia, fazendo o bem e curando a muitos, pregando e contando as parábolas do reino, ele soube que era considerado e temido como o próprio João Batista redivivo, ou então como um profeta seu sucessor. Sabemos, aliás, que João Batista, além de anunciar o verdadeiro Messias, perdeu a cabeça a mando de Herodes. Perto dali, em Tiberíades, também junto ao Mar da Galileia.

Jesus primeiro se retira das cidades e dos boatos. Afasta-se da ingratidão e até das tramas daqueles que não percebem a novidade de sua pessoa e pregação. E mesmo assim é seguido por muitos, que querem apenas tocá-lo, que o buscam e seguem até lugares desertos, como se fosse um verdadeiro líder, um novo Moisés na travessia do mar e do deserto. Jesus os alimenta do nada, ou de muito pouco. Seu poder deriva de Deus, mas ele não abusa disso. Ele alimenta cinco mil homens, sem contar mulheres e crianças. Homens que talvez, por gratidão, se oferecessem até mesmo para compor um exército sob o comando do Messias e rei verdadeiro, pretendido por Deus.

Nesse momento, porém, Jesus decide ficar só. Parece ser a primeira vez que faz isso. Não sabemos que ele tenha sido tentado, mas ele se retira para orar. E ele certamente medita, e pensa longamente no longo caminho à sua frente. Sobe ao monte sozinho de tardezinha e só desce para juntar-se aos seus discípulos tarde da noite, provavelmente já na madrugada.

Como Elias antes, Jesus busca estar sozinho com Deus, com Aquele que chamava de Pai. Elias, ouvimos já na leitura de 1 Reis 19.9-18, só com a força de um pouco de comida "caminhou quarenta dias e quarenta noites até Horebe, o monte de Deus". Protegeu-se da fúria da natureza e falou com Deus numa caverna. Foi de novo forçado por Deus ao terreno aberto, assim como os discípulos foram praticamente forçados ao mar aberto por Jesus. Ali, Elias sofreu a fúria do vento, do terremoto, e finalmente do fogo: fenômenos assustadores e que pareciam ser Deus, mas que não eram, e que estavam, na verdade, sob seu comando. Talvez até mais assustadores que as ondas e o vento na curta travessia no lado norte-noroeste  do diminuto Mar da Galileia - para nós, que nos banhamos no "marzão" dos nossos oceanos, um "marzinho", praticamente uma lagoa. (Mas lembremos: não é preciso muita falta de firmeza para ir ao fundo, e nem tanta água assim para se afogar.)

Jesus não precisa, como Elias, se recolher a cavernas para proteção. Ele escolhe o árduo caminho de superfícies abertas, de largos limiares e espaços limítrofes. Passa e se demora por lugares que não são nem sua origem nem seu destino, mas que lhe preparam perigos. O alto desértico do monte é um deles. Outro: a superfície perigosa do mar, sobre cujo fundo, porém, ele detém todo o poder, como sobre os infernos e os poderes políticos que pretendem, no final, aniquilá-lo, negando seu parentesco com o altíssimo e confundindo-o, com más intenções, com um mero agitador ou charlatão.

Querida comunidade, queridos irmãos e irmãs em Cristo! Todos nós somos Pedro, todos seus sucessores legítimos: no medo, mas também na esperança. Mas o texto do Evangelho de Mateus nos fala, mais ainda, do poder e da autoridade de Jesus, que é a base e a chance de êxito de toda a nossa travessia. Se ele não vier à nossa frente e atrás de nós, jamais chegaremos à outra margem. Esta travessia que não podemos fazer sem sua mão sempre estendida, que nos lembra da nossa origem na boa criação de Deus, e de nosso destino na redenção, conquistada pelo amor gratuito dispensado através do Seu Filho.

Pensemos e meditemos neste texto do Evangelho de Mateus. E quando vierem as tentações, oremos, como Jesus nos ensinou a orar. Se assim o fizermos, nunca estaremos sozinhos. Amém.



Prof. Dr. Luís Henrique Dreher
Juiz de Fora/MG
E-Mail: luis.dreher@ufjf.edu.br

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