Irmãos e irmãs em Cristo!
A Bíblia faz muitas comparações para falar da história do Povo de Deus e da sua relação com Deus. Uma dessas comparações é a Parábola da Vinha, uma história comum ao Antigo e ao Novo Testamentos, da qual primeiro os profetas e, depois, Jesus, se serviram para falar do amor de Deus e da ingratidão e da infidelidade do ser humano.
INTENÇÃO DOS TEXTOS
A Parábola da Vinha, em Isaías 5, denuncia a infidelidade do Povo de Israel ao profundo amor de Deus:
"Um agricultor escolheu o melhor terreno, selecionou mudas da melhor qualidade e tomou todos os cuidados necessários na preparação das covas e no plantio das mudas. Esperava colher uvas boas, mas só deu uvas azedas. Por isso, ele derrubou o muro de proteção e permitiu que pessoas estranhas pisassem a vinha e o mato tomasse conta do terreno."
Trata-se de uma palavra profética, que Isaías dirige ao Povo de Israel. A vinha é o próprio povo. Deus o "plantou" na Terra Prometida e lhe forneceu tudo que fosse necessário para que produzisse frutos de "direito e de justiça". Para tanto, Deus entregou os dez mandamentos como um muro de proteção.
Porém, ao invés de produzir bons frutos de obediência a Deus, de amor fraterno e solidário, o povo produziu frutos de idolatria e de infidelidade a Deus, de sangue derramado, de injustiça, de corrupção, de violência... E tudo isso sob o manto de uma falsa religiosidade.
Por isso, Isaías anunciou que as consequências da desobediência do povo a Deus seriam desastrosas: A cerca seria derrubada, a vinha ficaria à mercê dos invasores. Tudo isso se cumpriu posteriormente através da invasão dos Assírios e dos Babilônios, que deportariam os Israelitas como escravos.
A Parábola da Vinha, em Mateus 21, precisa ser lida sob a ótica de dois momentos históricos:
1. Conforme os evangelhos, Jesus conta e reinterpreta a Parábola da Vinha dentro do contexto da Semana Santa: Depois de ter entrado triunfalmente em Jerusalém, de ter expulsado mercadores e cambistas do Templo e de ter discutido com as principais lideranças do povo sobre a sua autoridade (Mateus 21.23).
Enquanto Isaías 5 faz uma denúncia contra todo o povo, Mateus 21 é uma palavra de Jesus contra as lideranças políticas e religiosas de Israel. O acento da parábola está na má administração dessas lideranças:
"Um senhor planta uma vinha com todo o cuidado necessário e a confia a uns lavradores, bons conhecedores da profissão. Chega o tempo da colheita e aquele senhor manda buscar a sua parte da colheita. Porém, os administradores não entregam o que é devido, maltratam os enviados e matam o próprio filho daquele senhor."
Na história contada por Jesus, a vinha continua sendo o Povo de Israel. Os lavradores maus são os líderes políticos e religiosos. Os enviados são os profetas e3 o filho é o próprio Senhor Jesus Cristo - antevendo o que aconteceria com ele na Sexta-Feira da Paixão.
A parábola denuncia as lideranças de Israel de quererem tomar o lugar de Deus, considerando-se donos da vinha e explorando o povo em proveito próprio. A crítica de Jesus corresponde ao que ele observou em Mateus 9.36: "Vendo Jesus as multidões, compadeceu-se delas porque estavam aflitas e exaustas como ovelhas sem pastor."
Conforme Mateus 21, a vinha não mais seria abandonada nem pisoteada, mas o cuidado da mesma seria entregue a outros administradores, às novas lideranças, fiéis e obedientes ao dono da mesma. Jesus ainda acrescenta que o Filho, que foi rejeitado e morto pelos administradores maus, tornar-se-ia a pedra angular e principal de uma nova vinha, de um novo povo - a Igreja!
2. Por fim, chegamos à redação dos Evangelhos, que aconteceu entre os anos 80 e 110 depois de Cristo. Ao darem testemunho de Ressuscitado como o Salvador do mundo, os evangelistas partiram de alguns fatos como pano de fundo:
A expansão do Cristianismo para além do Povo de Israel. Os cristãos se consideram, a partir do Ressuscitado, a nova vinha de Deus.
No ano de 64 d.C., Nero incendeia a cidade de Roma e culpa os cristãos. Intensifica-se a perseguição aos cristãos pelo Império Romano.
No ano de 70 d. C., os Romanos destroem o Templo de Jerusalém e espalham os israelitas pelo Império afora. Seria o fim do "Povo da antiga aliança".
Por volta de 80 d.C., acontece a ruptura definitiva entre judeus e cristãos. As sinagogas proíbem o testemunho cristão de Jesus Cristo nas mesmas. Os cristãos passam a se reunir em lugares próprios e a Igreja vai se consolidando como "nova vinha".
A vinha foi retirada e confiada a outros trabalhadores, que ofereçam ao "Senhor" os frutos devidos e acolham o "Filho" enviado.
ATUALIZANDO
Antes de nos rendermos à tentação de nos considerarmos a "perfeita vinha do Senhor", de nos considerarmos os melhores administradores da mesma, de termos acolhido bem o Filho amado do dono da vinha... precisamos identificar e avaliar os frutos que produzimos.
Tanto os ouvintes de Isaías quanto os interlocutores de Jesus eram considerados pessoas profundamente religiosas - lideranças políticas e religiosas respeitadas pelo povo. Aparentemente, tudo transcorria na mais perfeita ordem e normalidade. Porém, conforme Isaías 5, os frutos produzidos eram azedos; conforme Mateus 21, os administradores consideraram a vinha como sua de direito e excluíram o dono, explorando a mesma em benefício próprio e cometendo violência quando sua vontade era contrariada.
Na parábola, não se avalia o grau de religiosidade aparente, mas, sim, a qualidade dos frutos produzidos e a fidelidade e a obediência dos que cuidam da vinha. "Pelos frutos conhecereis a árvore" (Lucas 6.43-44).
À luz da Parábola da vinha queremos nos auto-avaliar:
A - Consideramos tudo o que somos e o que temos como propriedade única e exclusiva de Deus? Em consequência disto, prestamos a devida Ação de Graças "devolvendo" a Deus daquilo que ele nos deu tão generosamente? Ou entregamos apenas "uvas azedas"? Ofertamos as "primícias" ou apenas as "sobras"?
B - Como administramos a Vinha do Senhor - o mundo que ele criou bom e entregou aos nossos cuidados? Como cuidamos das pessoas e do meio-ambiente?
Hoje é dia de eleições no Brasil = com que responsabilidade nós exercemos o nosso voto? Quais são as nossas expectativas e qual é a nossa participação na construção de uma cidadania inclusiva e participativa? Como acontece a liderança: São uvas azedas de corrupção, de exploração, de desmandos?
C - Como nós acolhemos o "Filho" do dono da vinha, nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo? Sentimo-nos unidos a ele pelo vínculo do Batismo ou preferimos, na prática, viver emancipados, independentes, senhores de nossas próprias decisões e de nossos próprios caminhos?
D - E, por fim, quais são os frutos que nós produzimos? São uvas boas e doces = frutos de comunhão fraterna do Povo de Deus, fiel e obediente ao Senhor, de justiça, de amor ao próximo, de solidariedade, de perdão, de paz, de cidadania plena para tod@s, de cuidado...?
Ou são uvas azedas = idolatria e infidelidade a Deus, egoísmo, ganância, exploração, opressão, corrupção e violência?
DESAFIO
Viver nossas relações com o mesmo amor e cuidado mostrados por Aquele que "plantou a vinha". Ser pessoas generosas e solidárias como sinal da pertença à "Pedra Angular" - Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo! Amém