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ISSN 2195-3171





Göttinger Predigten im Internet hg. von U. Nembach

24.DOMINGO APÓS PENTECOSTES , 30.10.2016

Jesus, Zaqueu e a multidão
Predigt zu Lucas 19:1-10, verfasst von Pedro Puentes Reyes

Este relato, conservado só pelo evangelista Lucas, é um dos mais conhecidos. Em geral, ele é utilizado para encorajar a perseverança na fé. E seu discurso soa mais ou menos assim: “Zaqueu, no seu desejo de conhecer Jesus, enfrentou sua má fama, baixa estatura, medo do ridículo e bloqueio da multidão. Nenhum obstáculo foi  suficientemente grande  para deter este pequeno homem. Sua fé e coragem o fizeram vencer as adversidades, conquistando a salvação que nem ele mesmo esperava”. Desta forma, Zaqueu é apresentado como um exemplo da fé que alcança e conquista a graça, o favor de Deus. Entretanto, tal mensagem está na contramão daquela resgatada por Lutero e o movimento da Reforma. Surge assim a pergunta: como interpretar este texto desde a perspectiva do Deus que vem até nós? Eis o nosso desafio a seguir.

O personagem central da narração é o Jesus que está a caminho de Jerusalém. Nessa caminhada ele entra nas cidades, aldeias, casas, grupos e vidas de pessoas. Esse dado não é um simples artifício literário, ele é uma chave de interpretação, a saber, que em Jesus, Deus vem até nós. Em Jesus, Deus entra em nossos mundos para acolher e transformá-los. Isto, independente da nossa profissão, qualidade moral ou lugar na sociedade. E a prova disto é o nosso texto.

Que Deus, em Jesus, entre em Jericó é significativo. Trata-se, segundo a tradição do Antigo Testamento (Js 6.26; 1Rs 16.34), de uma cidade “amaldiçoada”. Um lugar onde o esforço pela sua reconstrução e desenvolvimento acarretaria perdas irreparáveis: a morte do filho primogênito ou do mais novo. A perda da linhagem, do nome, remete à destruição do futuro, e é isso que está em jogo. Jericó é a cidade que exige o sacrifício da continuidade da vida a cambio de um pouco de prosperidade. Coloca-se a perder o que se quer ganhar: uma vida de bem-estar. Noutras palavras: é a cidade-símbolo de ausência da bênção de Deus. Pelo menos, aos olhos de muitas pessoas, ela foi esquecida ou descartada do roteiro de Deus. Entretanto, em Jesus, Deus se lembra desta cidade e entra nela para encontrar o que estava perdido.

Entretanto, nem todas as pessoas se alegram com esta visita. Duas vezes são mencionadas as pessoas moradoras desta cidade, e em ambas as vezes, é negativa. Elas aparecem exercendo um controle e pressão em quem a habita ou a visita. De alguma forma, a organização da vida nesta cidade oprime.

Assim, para Zaqueu, a multidão é quem define sua vida: ele é um maioral dos publicanos, rico e pecador. Assim convém que seja para a cidade, pois no fundo alguém tem de fazer o trabalho sujo. O detestam e excluem, mas ao mesmo tempo, usufruem e precisam dele para manter o sistema de opressão.   A multidão é como uma teia que tolhe a procura de Zaqueu por algo a mais: “procurava.., mas não podia, por causa da multidão” (v.3), diz o texto. A vida deste cobrador de impostos é como a do passarinho preso na rede, luta pela sua libertação, mas sem sucesso.

Também sobre Jesus a multidão exerce uma função de controle, onde nada pode ser diferente daquilo que já foi definido. Por isso, todas as pessoas que viram Jesus tratar Zaqueu diferente daquilo que eles tinha previsto, protestam. O texto diz: “começaram a resmungar: este homem foi se hospedar na casa de um pecador” (v.7). A multidão acusa Zaqueu de pecador e não aceita que ele receba um tratamento diferente do que ela definiu. Mas, Jesus rejeita essa proposta. A acusação da multidão oculta o essencial: ser ela mesma quem criou o cargo, a função e a existência que agora denuncia como pecado. Ela não só criou as condições para o “pecado”, como faz questão de sustentá-lo, não permitindo que Zaqueu mude. A cidade de Jericó mostra assim a estrutura da sua maldição. Ela é uma cidade amaldiçoada, assim como muitas outras, mas não porque lhe tenha sido imposto um desígnio de fora. Sua maldição consiste em ser prisioneira das suas próprias construções de vida. A atitude da multidão nos lembra de que a maldade, o pecado, não consiste simplesmente de um  assunto individual. Toda existência humana acontece numa relação de retroalimentação entre indivíduo e comunidade.  

Contudo, o que podemos dizer de Zaqueu? Será ele uma simples vítima das construções da multidão, da cidade? Com certeza ele próprio tem sua quota de responsabilidade e culpa.  Afinal, não se chegava a ser chefe dos cobradores de impostos sem esforço, diligência, astúcia e corrupção. Mas, para não especular demais, temos sua própria confissão: “E, se roubei alguém, vou devolver quatro vezes mais” (v.8). Com essas palavras ele se confessa ladrão, os quais, segundo ÊX 22.1, são obrigados a devolver quatro vezes o roubado. Assim, entre seus desejos, ambições pessoais e as oportunidades criadas pela estrutura da sociedade de Jericó, Zaqueu foi construindo sua vida num misto de coisa justa e injusta. Ele paga um alto preço por um pouco de prosperidade, cumpre assim, na sua vida, a maldição da cidade de Jericó.

Nem por isso, devemos esquecer a palavra pronunciada por Jesus sobre o nosso cobrador de impostos: “este é filho de Abraão” (v.9). A este respeito duas observações. A primeira é que, como filho de Abraão, com certeza conhecia o salmo 32, colocado como leitura para este domingo. Então, assim como Davi, quantas vezes ele se debateu entre a recusa por confessar seu pecado e a angústia da culpa, até reconhecer seu erro e finalmente confessar, obtendo o perdão? Não esqueçamos que ele procurava. Mas, a multidão só vê nele um pecador, não o reconhece como um filho de Abraão e, com isso, nega-lhe a possibilidade de perdão, mudança e nova vida. A segunda observação é que, a rigor, nenhuma das informações sobre o status socioeconômico e moral de Zaqueu consegue descrever quem ele é para Deus. Só a palavra que vem de Deus fala a verdade última sobre ele: “este também é um filho de Abraão”.

Entretanto, o que há de tão especial neste filho de Abraão para que Jesus vá procurar e salvá-lo? O que motiva Deus vir até o que está perdido?

O significado do nome Zaqueu aponta para a chave: “Deus se lembra”. Para o escritor bíblico o agir de Deus se fundamenta no fato de que Ele não se esquece da sua promessa. Deus é fiel a seu amor e misericórdia prometidos a sua criação. É o “Deus que se lembra”: que coloca fim ao dilúvio (Gn 8.1); que salva Ló da destruição de Sodoma (Gn 19.29); que liberta seu povo do Egito (Êx 2.24); que envia um salvador (Lc 1.72); que vem “buscar e salvar quem está perdido” (v10).

Com estas palavras o evangelista Lucas afirma que não há lugar neste mundo que abale a fidelidade de Deus ao seu amor e misericórdia. A paixão de Deus pela criação faz com que Ele esteja disposto a ir aos confins deste mundo para encontrar o perdido. Não há empecilhos, fronteiras, limites que impeçam Deus de encontrar, resgatar e salvar. Nem mesmo a cidade “amaldiçoada”, organizada contra Ele. Assim Deus, que recorda sua promessa de amor ao mundo, é fiel a sim mesmo e busca para salvar Zaqueu.

Perante este amor incondicional do “Deus que se lembra”, a única resposta possível é aquela formulada por Maria: “A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegrou em Deus, meu Salvador, porque contemplou na humildade da sua serva”. (Lc 1.46-47). E, Zaqueu fez sua própria versão: ele, sabendo-se amado, reconfigura sua vida segundo a gratidão: restitui a quem ele prejudicou e lembra-se das pessoas mais frágeis e ainda presas na teia de vida construída pela cidade, que neste caso são  pessoas mais pobres.

E nós hoje, como vincular as palavras do evangelho às nossas vidas? Além das considerações que surgiram durante a prédica, rogamos para que o Espírito Santo:

- nos ajude a reconhecer que, ainda hoje, nada impeça que Deus encontre e salve o que ama;

- nos ajude a enxergar que Deus vem até nós e age rejeitando a injustiça e acolhendo e restaurando o perdido;

- converta o nosso coração para abandonarmos nossos preconceitos, que nutrem construções de vida que pretendem ocultar o agir salvador de Deus;

- nos conceda alegria quando Deus no seu amor e misericórdia encontra e coloca no caminho da restauração o perdido;

- nos dê a coragem e persistência para construir nossas vidas, amadas por Deus, segundo toda bondade, justiça e verdade. Amém.



P. Dr. Pedro Puentes Reyes
Porto Alegre/RS
E-Mail: Pedro3433@yahoo.com.br

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