“O que é mais importante?”

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“O que é mais importante?”

 Texto da prédica: Mateus 22.34-46 | Prédica para o  21º DOMINGO APÓS PENTECOSTES – 25 de outubro de 2020. | Luis Henrique Sievers |

Estimada comunidade, estimados irmãos e irmãs em Cristo,

Várias situações na vida nos levam a fazer esta pergunta: “O que é mais importante?”. Não queremos perder o foco com coisas secundárias. Buscamos o que é fundamental, decisivo, em uma determinada situação e momento. E quando se trata de fundamentar e estruturar toda uma vida, queremos firmeza, um fundamento que resista às tempestades, um farol que nos oriente pelas ondas revoltas do viver.

Para grupos religiosos como os fariseus, por exemplo, seguir à risca as Leis e os Mandamentos do seu povo, era algo do qual não se deveria abrir mão. A princípio, não há nenhum problema nisso. Precisamos de regras de convivência, que estabelecem direitos e deveres. Elas visam a promover a vida. Tornam-se, porém, obsoletas quando não servem mais a esse objetivo, esse fundamento. Em linguagem bíblica, o dia de descanso foi feito para servir ao ser humano e não o contrário ( Mc 2.27).

Segundo o evangelista Mateus, os fariseus eram um grupo que estava constantemente questionando Jesus. Queriam pegá-lo em contradição e desmoralizá-lo diante do povo e das autoridades com perguntas maliciosas. Esse é o caso do texto da pregação de hoje. Um dos seus representantes fez a seguinte perguntou a Jesus: “- Mestre, qual é o mais importante de todos os mandamentos da Lei?” A primeira parte da sua resposta foi: “Ame o Senhor, seu Deus, com todo o coração, com toda a alma e com toda a mente.“ Resposta certa (Dt 6.5). Nenhuma surpresa. Toda pessoa devota conhecia essa parte da Lei.

Para a surpresa dos fariseus, Jesus deu continuidade à sua resposta e acrescentou: “Ame os outros como você ama a você mesmo.“ Esse é “o segundo mais importante” e “parecido com o primeiro” mandamento, explicou Jesus. Está igualmente na Lei que todo devoto deveria conhecer (Lv 19.18). Mas, no geral, as pessoas lembram mais do amor a Deus do que do amor ao próximo.

Na sua resposta, Jesus mostrou que estava por dentro do assunto. Em primeiro lugar, alertou os fariseus de que o mesmo amor que tinham por Deus também deveria ser dedicado ao próximo. Não dá para descolar um do outro. No contexto do livro de Levítico, esse amor ao próximo se expressa no julgar com justiça, sem parcialidade, no não espalhar mentiras entre as pessoas ou dar falso testemunho, bem como no não guardar ódio no coração e rejeitar a vingança ( Lv 19.15-18). Tão prático pode ser o amor ao próximo.

Em segundo lugar, Jesus alertou o grupo dos fervorosos fariseus, seguidores da Lei e da ordem, que todo amor próprio vira orgulho, arrogância e egoísmo, se não passar pelo crivo do amor ao próximo. Eles correm o risco de se encantarem pela sua própria espiritualidade e amarem apenas a si mesmos. Assim como na lenda grega de Narciso, que amou a sua própria imagem refletida na lagoa de Eco. O amor saudável se revela em uma trilogia: a Deus, ao próximo e a si mesmo. Ele enfraquece e adoece fora dessa trilogia. Fica desfigurado.

Jesus também explica que esses dois mandamentos são a chave, o critério, de leitura da Lei e dos profetas (v. 40). O que promove o amor a Deus e o amor ao próximo é mais importante. O resto é “palha”, como diria Lutero. Faltava aos fariseus ler com os olhos do amor os textos sagrados que eles conheciam e seguiam. Aparentemente temiam e amavam a Deus, estudando a sua palavra e guardando os seus mandamentos. Entretanto, não expressavam esse mesmo fervor e zelo no amor ao próximo, na prática da misericórdia e da compaixão.

Jesus motivou os fariseus a reconsiderarem a visão que tinham a respeito do Messias. O mais importante não é a sua descendência, “de Davi” (v.42). O mais importante é que ele revela o mais profundo amor de Deus pela sua criação: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu Filho unigênito, para que todo que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16). O verdadeiro Messias não vem para ser servido, mas para servir e dedicar a sua vida e sua morte para resgatar pessoas das suas aflições, suas opressões (Mt 20.28).

O amor que se expressa na relação com o próximo, faz parte daquilo que é fundamental, importante: “Nós amamos porque ele nos amou primeiro” (1 Jo 4.19). Separar o amor a Deus do amor ao próximo não é, portanto, evangélico. Aqui cabe o alerta da primeira carta de João: “Se alguém diz: ‘Eu amo a Deus’, mas odeia o seu irmão, é mentiroso. Pois ninguém pode amar a Deus, a quem não vê, se não amar o seu irmão, a quem vê.” (1 João 4.20)

Aquilo que nós chamamos de “espiritualidade”, “discipulado”, “seguimento de Jesus Cristo”, passa pelas atitudes concretas de amor às outras pessoas, que são visíveis, próximas ou distantes.  Não é bíblico e não é cristão cultivar uma espiritualidade descolada das relações concretas que temos com as outras pessoas e com toda a criação de Deus. Espiritualidade não é apenas a expressão de um fervor religioso, de louvor profundo e lembrança dos mandamentos, coisas que não faltavam aos fariseus. Espiritualidade saudável é, em seu sentido mais profundo, uma vivência da fé em todos os níveis de nossa existência, que se expressa no amor a Deus, ao próximo, como a si mesmo.

Nas palavras do apóstolo Paulo: “Poderia (…) ter tanta fé, que até poderia tirar as montanhas do seu lugar, mas, se não tivesse amor, eu não seria nada” (1 Coríntios 13.2). A mais profunda espiritualidade fica capenga, vazia, se ela deixar de fora o amor ao próximo, o serviço desinteressado pelo bem-estar das outras pessoas e de toda a criação de Deus. O amor revoluciona a realidade, quando ele é vivido em plenitude em cada recanto do nosso cotidiano, das nossas relações com o próximo, especialmente na prática da justiça e da solidariedade com os mais necessitados. Por isso, “amemo-nos uns aos outros, porque o amor procede de Deus (…) Aquele que não ama não conhece a Deus, pois Deus é amor” (1 Jo 4.7 e 8). Amém.

Pastor Luis Henrique Sievers

Lajeado, Rio Grande do Sul, Brasilien

luishenrique.sievers@yahoo.com

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