7º DOMINGO DA PÁSCOA

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7º DOMINGO DA PÁSCOA

PRÉDICA PARA O 7º DOMINGO DA PÁSCOA | 16 de maio de 2021 | Texto bíblico: 1 João 5.9-13 |  Renato Küntzer |

Paz e bem!

Aceitar o testemunho de pessoas ou o testemunho de Deus? Esse é o tema central da carta escrita para uma comunidade ou leitores específicos e com problemas pontuais, mas tem, ao mesmo tempo, a característica de ser uma mensagem válida em qualquer tempo e lugar. Sua origem provavelmente foi em Éfeso, na Ásia Menor, por volta do ano 100. Seu objetivo é auxiliar as comunidades a retomarem o testemunho da afirmação de fé:  Deus se fez humano (1 João 1.1-3) em Jesus Cristo

Como uma imagem importante, para ser adequadamente apreciada e entendida, necessita de moldura e torne-se um quadro atrativo aos olhos, assim os textos anteriores e posteriores, ajudam a entender essa parte da carta que temos em vista, para que não façamos uma interpretação alheia às suas intenções.

A discussão que cerca nosso texto envolve o tema de um caminhar na luz. Deus é luz. Portanto há um caminhar orientado por Deus, na vida de Jesus, e que culmina com a experiencia de comunhão com as outras pessoas. Há também um caminhar nas trevas, que não é de Deus. Esse caminhar baseia-se na mentira e na falta da verdade. Assim quem ama o seu irmão e a sua irmã, permanece na luz e nele não há tropeço. Quem odeia o seu irmão e a sua irmã, caminha nas trevas e não sabe aonde vai. Essa discussão é a moldura que envolve a comunidade concreta, de pessoas empobrecidas e marginalizadas, que se torna um espaço de acolhida, comunhão e amor, por andar na luz.  Assim o agir solidário e amoroso de Jesus em favor dos mais fracos e marginalizados é testemunhado no agir da comunidade. Isso não isenta essa comunidade pequena e frágil de estar envolvida em um conflito que provocava divisões internas.

Havia controvérsias quanto ao testemunho de como viver a comunhão com Deus e com Jesus. Começava por colocar em dúvida a historicidade e a importância da vida, paixão e morte de Jesus na vivência da fé. Havia uma corrente que afirmava que o corpo de Jesus era uma ilusão e que sua crucificação teria sido só aparente. Não conseguiam aceitar Deus crucificado. Outros afirmavam que a revelação de Deus e a salvação viriam pelo conhecimento e especulação intelectual e por revelações espirituais elevadas, que desvendavam assim o mistério. Nessa conjuntura religiosa era necessário testemunhar que o verdadeiro conhecimento de Deus se dá por meio da

vida concreta de Jesus Cristo e da prática do amor aos irmãos e irmãs com gestos e ações de amor (1 João 3.17-18).

O tema é dar testemunho. No v.9 aparece a expressão “testemunho dos homens” em oposição ao “testemunho de Deus”. Aponta-se para o conflito: um grupo tinha o testemunho dos homens e outro o testemunho de Deus. Envolvida no conflito, a comunidade próxima ao autor da carta, se identifica como quem tem o testemunho de Deus. Essa afirmação e confirmação da importância, do valor e da verdade do testemunho, está baseada no fato de que “Ele nos deixou um testemunho de seu Filho”. Aqui está o cerne do testemunho: “O testemunho é este: Deus nos deu a vida eterna”. Não há nada especulativo ou de uma revelação espiritual elevada em relação ao que seja a vida eterna. É bem simples a afirmação: “Esta vida está em seu Filho. Quem tem o Filho, tem a vida e quem não tem o Filho, não tem a vida” (v.11)

Esse testemunho claro e sem rodeios já se encontra no Evangelho de João 17.3 quando diz: “ora, a vida eterna é esta: que eles conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e aquele que tu enviaste, Jesus Cristo.” Vida eterna é o conhecimento de Deus e esse conhecimento é testemunhado por um evento e um gesto na história, o envio e a presença viva e real de Jesus Cristo. A vida pública de Jesus é o verdadeiro testemunho que dá conhecimento de Deus. Estar em comunhão com Deus, testemunhar a Jesus Cristo como Filho de Deus e amar aos irmãos e irmãs com gestos e ações de partilha é ter parte na vida eterna, já, aqui e agora.

Em Jesus Cristo está o conhecimento de Deus. O amor de Deus manifestado nas ações concretas de Jesus se dá neste mundo. Os cristãos seguidores de Jesus, a seu exemplo, buscam dar testemunho dessa ação histórica. O agir de Deus acontece na história de seu povo em particular dos pobres e marginalizados. O agir solidário de Deus em favor dos mais fracos tem continuidade no agir da comunidade joanina e entre seus discípulos.

O texto nos desperta para a urgência da prática do amor como consequência da fé e o enfrentamento ao testemunho da mentira.

Há uma hostilidade à confissão da fé cristã e um desvio no vínculo entre fé e amor. Essa hostilidade está presente na falta de compromisso da prática da justiça (3.7,10), ao amor incondicional a outra pessoa (2.9,11; 3.10ss; 4.20) e a ajuda concreta aos pobres (3.17).

O testemunho da verdade é urgente e determinante para a existência da comunidade. É uma exortação necessária para os nossos tempos em que, sem constrangimento nenhum, há um testemunho de pessoas e que não é o testemunho de Deus, querendo se impor nas narrativas que envolvem o enfrentamento à pandemia, ao racismo institucionalizado, ao preconceito diário e à violência seletiva. Enfrentar a mentira, que recebeu um nome pós-moderno de Fake News, e a defesa intransigente da verdade é

um compromisso que cabe a comunidade de fé, seguidora da Jesus. Passou da urgência, quando estamos nos aproximando do sacrifício de 500 mil vidas, resultado da negligência, do descaso e do negacionismo. Passou do limite da tolerância a intervenção seletiva do Estado quando age de maneira violenta em territórios de população negra e indígena. Tomado pelos acontecimentos recentes e em vista de uma história mal contada que é o da abolição da escravidão, identificado como o dia 13 de maio, a relação entre pessoas diferentes na cor da pele, cultura, espiritualidade, condições econômicas é permeada de preconceitos, julgamentos e violência. São as raízes de 350 anos de escravidão negra e indígena que configurou nossa sociedade, nossas opiniões, nossos julgamentos de valores e de moral. A promessa de Jesus no dia da ascensão, celebrada esse ano no dia 13 de maio, parece ser dita ao vazio quando afirma que “vocês receberão poder e serão minhas testemunhas” (Atos 1.8). É vergonhosa a política de porteira aberta “para que a boiada passe” quando se trata da exploração predatória dos recursos naturais, da invasão de territórios dos povos indígenas e da liberação sem controle de agrotóxicos para o lucro do agronegócio local e de empresas multinacionais. É inaceitável a naturalização da misoginia e violência diária contra as mulheres, fruto de uma sociedade patriarcal e de uma religiosidade cristã fundamentalista.

O testemunho da verdade precisa expor e visibilizar as questões de vida e morte que envolvem o compromisso da fé com o amor: “aquele que possuir recursos deste mundo e vir o seu irmão padecer necessidade e fechar-lhe o coração, como pode permanecer nele o amor de Deus?” (3.17). Isso não é mera retórica. Põe o dedo em uma ferida séria da comunidade. Aqui está a sua responsabilidade e a sua identidade quando afirma ser testemunha da verdade. Todas as pessoas se encontram em situação de necessidade da radical solidariedade e misericórdia de Deus. Todas as pessoas são, em sua condição humana, receptoras indignas da misericórdia de Deus.  Não há aqui privilégio, vantagem nem mérito pessoal. Para Deus não há quem tenha mais valor, razão pela qual a outra pessoa possa estar na condição de ser algo, um objeto do qual se possa dispor ou descartar.

É no testemunho da verdade que o amor de Deus enxerga necessidades. O amor necessariamente se solidariza com os injustiçados, ajuda os mais fracos, defende os excluídos da vida digna. O amor dá prioridade a quem está em perigo e sofre prejuízo na sua dignidade. O amor de Deus exige como resposta o amor das pessoas entre si.  Isso é um alto padrão de conduta humana. Ainda que a pessoa seja justificada pela fé e não por suas boas obras, é inimaginável uma fé que não se torne ativa no amor.

P. Renato Küntzer

Boa Vista do Buricá – Rio Grande do Sul, Brasilien

renatok06@hotmail.com

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