Mateus 13.1-9, 18-23

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Mateus 13.1-9, 18-23

PRÉDICA  PARA O 7º DOMINGO APÓS PENTECOSTES | 16.07.2023 | Mateus 13.1-9, 18-23 | Eloir Enio Weber |

Que a graça e a paz do Deus que é Pai, Filho, Espírito Santo esteja conosco e que essa presença nos dê a esperança de que as boas sementes lançadas por ele germinem em nossa vida.

Você gosta de contar histórias? E de ouvir alguém contando histórias? Nós, adultos, gostamos disso. As crianças, então, ficam encantadas ao ouvir alguém contando histórias. E tem toda uma técnica para contar histórias, algumas pessoas são especialistas nisso: colocam detalhes, entonações e volume de voz, trejeitos… No sul do Brasil tem uma expressão para isso: “contar causos”. Quando criança, eu gostava quando um vizinho dos meus pais, o Helmut, vinha jogar cartas na nossa casa. Ele tinha muitos “causos” para contar sobre acontecimentos na lavoura, com os animais da sua propriedade, na vizinhança… Era bom ficar “de espreita”, ouvindo-o contar os seus “causos”.

O escritor uruguaio, Eduardo Galeano, ao apresentar o seu livro “Os Filhos da Terra”, disse que: “os cientistas dizem que somos feitos de átomos, mas um passarinho me diz que somos feitos de histórias.” Sim, somos movidos por histórias e, diariamente, Deus em Cristo escreve, junto conosco, novos capítulos da nossa história. Jesus conhecia essa fascinação humana muito bem. Ele contava “causos” às pessoas de sua época para que elas pudessem refletir sobre a vida, sobre a fé, sobre o cotidiano, sobre relacionamentos. Jesus usava essa forma de ensino para possibilitar o acesso de todas as pessoas, conforme a sua capacidade de compreensão, ao “conhecimento dos mistérios do Reino dos Céus” (Mt 13.11). Esses “causos” de Jesus que estão registrados na Bíblia são chamados de Parábolas. São histórias que retratam a vida diária da época a fim de servirem de ensinamento. E ainda hoje, para nós, elas servem e nos fazem pensar em nossa história e em nossa vida. Elas têm um começo despretensioso, mas enquanto as ouvimos, refletimos, e acabamos dentro delas. E, assim, o Espírito Santo nos conduz e nos auxilia para que a narrativa se transforme em alimento para a nossa fé, a fim de que possamos ressignificá-las para dentro da nossa realidade.

Ler texto de prédica: Mateus 13.1-9, 18-23

O nosso texto, que é uma parábola de Jesus, está dentro de um bloco maior, no capítulo 13 do Evangelho de Mateus. O cenário no qual se desenrolam os ensinamentos, por meio de sete parábolas diferentes, que são contadas nesse capítulo do Evangelho de Mateus, é peculiar. Jesus está na praia, no Mar da Galileia. A multidão se achega e Jesus acaba entrando numa embarcação pequena que se transforma em púlpito de pregação e de ensino. A parábola em destaque é conhecida como a Parábola do Semeador.

A poetiza Cora Coralina, no poema “Mascarados”, escreveu:

Saiu o Semeador a semear.

Semeou o dia todo

e a noite o apanhou ainda

com as mãos cheias de sementes.

Ele semeava tranquilo,

sem pensar na colheita

porque muito tinha colhido

do que outros semearam.

Seja você esse semeador:

semeia com otimismo,

semeia com idealismo

as sementes vivas

da Paz e da Justiça.”

O texto bíblico de hoje tem duas partes. Na primeira parte, nos versículos 1 a 9, Jesus conta a Parábola do semeador. Na segunda parte, versos 18 a 23, ele explica o significado da Parábola.

Jesus contou que um semeador saiu para o seu trabalho de semear as sementes. A primeira parte caiu na beira do caminho e os pássaros a comeram. Jesus explicou que essa parte das sementes simboliza que, em alguns casos, o evangelho é semeado no coração das pessoas, mas o maligno vem e arrebata o que foi semeado (Mt 13.19). A segunda parte, por sua vez, caiu em terra pouco profunda, com rocha. O sol queimou as plantinhas recém germinadas, pois as raízes eram pouco profundas. Simbolizam a pessoa que logo recebe com a alegria o evangelho, mas que diante da angústia e das dificuldades da vida, esmorece (Mt 13.21). A terceira parte das sementes, conforme a Parábola, caiu entre espinhos que a sufocaram. Conforme a explicação de Jesus, essas sementes simbolizam as pessoas cuja fé é sufocada pelas preocupações deste mundo e a fascinação com as riquezas (Mt 13.22). A quarta e última parte, no entanto, caiu em terra boa e produziu 100×1, 60×1 e 30×1. Essas sementes, conforme a explicação de Jesus, representam as pessoas que ouvem a palavra e a compreendem (Mt 13.23).

Facilmente poderíamos, cheios de razão, apontar o dedo acusador para o semeador e dizer que ele foi displicente com as sementes. Faltou cuidado para evitar o desperdício. Mas é preciso lembrar do propósito de Jesus com a Parábola: falar como a palavra é recebida no coração humano e como ela se desenvolve, ou não, em nossa vida. De fato, o desperdício de sementes que acontece na parábola salta aos nossos olhos que vemos tudo do ponto de vista econômico/financeiro. Esse desperdício, intencionalmente colocado na Parábola, está ligado com a graça de Deus. Deus semeia graciosamente em nós, pela ação do Espírito Santo, a semente-palavra e confia que possamos fazer as escolhas certas, a partir da sua graça e do seu agir, para que as sementes da fé que se manifestam em forma de amor, de justiça e de solidariedade brotem em nós, cresçam e produzam mais sementes para serem repartidas.

Outro aspecto que o texto destaca é a multiplicidade de solos e ambientes nos quais as sementes foram lançadas. São quatro ambientes diferentes descritos por Jesus. Facilmente, mais uma vez, o nosso dedo acusador pode ser indicado em forma de menosprezo, prejulgamento e cheio de preconceito para os ambientes que não produziram de forma adequada. É preciso que sejamos sempre de novo lembrados de que temos em nós todos os tipos de solo de forma simultânea. Somos tudo ao mesmo tempo, e Deus sabe disso. E mesmo assim ele continua lançando as suas preciosas sementes. Sem o perdão de Deus, alcançado a nós por meio da morte e ressurreição de Jesus Cristo em nosso favor, o nosso solo seria totalmente inadequado para receber as sementes. Deus, na sua misericórdia, lembrou da nossa miséria e interveio para que sejamos alvos de farta semeadura e boas sementes.

Com parábola, Jesus aponta para o fato de que a pessoa que está semeando não faz distinção entre as diferentes áreas que recebem as sementes. Ela só semeia. Algumas sementes caíram à beira do caminho e foram comidas pelos pássaros, outras brotaram, mas por causa das pedras ou dos espinhos não cresceram. Diante disso, facilmente se pode afirmar no senso comum, de que a pessoa que semeou desperdiçou sementes. Mas, o nosso contrassenso é flagrado, pois dificilmente consideramos que Deus “desperdiça” seu amor por nós. Assim como a palavra de Deus nem sempre germina, cresce e produz frutos em nós, é preciso ser justo a afirmar que, em nenhum dos casos, o fato da não-produção pode ser creditado à qualidade das sementes. As sementes são boas; são as questões alheias que impedem o desenvolvimento. Com isso, somos levados a perceber a graça de Deus que age em nós. A graça de Deus é maior do que a fome dos pássaros, o calor do sol, os espinhos. Jesus nos alcançou pelo seu amor e, com isso, as sementes caem em nosso solo, apesar das nossas inconstâncias.

Nesse sentido, tenho pensado em um poema de Machado de Assis, cujo título é “Os Semeadores”.

“Vós os que hoje colheis, por esses campos largos,

O doce fruto e a flor,

Acaso esquecereis os ásperos e amargos

Tempos do semeador?

Rude era o chão; agreste e longo aquele dia;

Contudo, esses heróis

Souberam resistir na afanosa porfia

Aos temporais e aos sóis.

Poucos; mas a vontade os poucos multiplica,

E a fé, e as orações

Fizeram transformar a terra pobre em rica

E os centos em milhões.

Nem somente o labor, mas o perigo, a fome,

O frio, a descalcês,

O morrer cada dia uma morte sem nome,

O morrê-la, talvez.

Entre bárbaras mãos, como se fora crime,

Como se fora réu

Quem lhe ensinara aquela ação pura e sublime

De as levantar ao céu!

Ó Paulos do sertão! Que dia e que batalha!

Venceste-a; e podeis

Entre as dobras dormir da secular mortalha;

Vivereis, vivereis!”

Sim, somos também semeadores porque recebemos as boas sementes lançadas pelo próprio Deus. Não somos os responsáveis pela germinação, pelo crescimento e pela produção. Mas, sim, somos uma das formas com as quais a semeadura é feita pelo próprio Deus, o dono da plantação, aquele que faz germinar, crescer e produzir novas sementes a serem compartilhadas. Tem uma obra de arte que traz essa mensagem de forma visível. Convido para olharmos a imagem. (projetar a imagem – deixar em silêncio enquanto as pessoas observam)

A foto é de uma estátua de bronze que fica na cidade de Kaunas, na Lituânia. A obra de arte é conhecida como “o semeador de estrelas”. Ela nos desafia para que vejamos além daquilo que está diante dos nossos olhos, da mesma forma como as parábolas de Jesus. Durante o dia ela não chama muita atenção, não tem nada de mais. No entanto, à noite, com a projeção de uma luz, dá a impressão de que a pessoa está semeando estrelas com a mão. A sombra da estátua contra o muro, no qual há estrelas encravadas, faz surgir uma nova leitura da obra de arte. Faz refletir que nem sempre a gente consegue ter a dimensão total da importância das sementes no momento em que as lançamos. No entanto, a vida não é só feita de dias, também há noites bem escuras para serem enfrentadas. Por isso, a obra de arte dá uma dimensão toda especial à noite. Pois, quando a noite chegar na vida das pessoas que recebem as sementes lançadas, elas vão perceber que as sementes são sinais luminosos da luz de Cristo, que nos envolve em sua graça, e nos faz perceber a germinação que coloca brotos de vida renovada, esperança de novos frutos.

Desejo que na vida de vocês o Deus da vida – Pai, Filho e Espírito Santo – continue semeando as boas sementes da fé e do seu Reino. E que, quando chegar a noite, vocês tenham a noção do quanto as sementes lançadas são sinais da presença constante, graciosa e amorosa de Deus em sua vida. Amém.

P.Ms. Eloir Ênio Weber

São Leopoldo – Rio Grande do Sul (Brasilien)

eloir@sinodal.com.br

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