Marcos 9.30-37

Marcos 9.30-37

PRÉDICA PARA O 17º DOMINGO APÓS PENTECOSTES – 19.09.2021. | Texto bíblico: Marcos 9.30-37 | Ilmar Kieckhoefel |

Textos auxiliares: Jr 11.18-20; Sl 54; Tg 3.13-4.3, 7-8a

Ótimas leituras nos PLs (Proclamar Libertação): 16, 22, 36, 42, 45.

(Dedico essa Reflexão ao querido Casal Malschitzky, Professor Harald e sua querida esposa Regina que, nesse dia, completam 57 Anos de abençoada Caminhada Matrimonial).

Estimada Comunidade!

Enquanto vivermos, estejamos a caminho de um entendimento melhor acerca da vida; basta que a gente se disponha a aprender ou a reaprender algo esquecido, ao longo de todo o percurso…

  1. Ainda que Jesus não tivesse dificuldade de lidar com desafios e enfrentamentos/constrangimentos – nem mesmo de expor e de sustentar Suas próprias convicções e opiniões – houve momentos nos quais, por prudência, Ele preferiu adotar a postura do recolhimento e da discrição. Diz o texto: “preferiu que ninguém soubesse o Seu trajeto…”

É o Evangelista Marcos que melhor nos apresenta um Jesus e uma Comunidade Cristã com características críticas frente a uma realidade social/política tensa, tomada por problemas de injustiça e pobreza. Razão pela qual, por motivos óbvios, pelo menos naquele momento, Jesus desejou evitar atritos; talvez, adiá-los. Afinal, as autoridades estavam atentas a Seu comportamento.

  1. Além dessa razão, Jesus queria preparar ainda melhor Seu grupo de seguidores. Ou seja, todos os cuidados deveriam ser tomados para precavê-los! Ainda mais, agora, que estavam a caminho da capital, onde bem sabemos, ficava ‘a toca-do-lobo’. Embora os discípulos tivessem ficado impressionados com tudo que haviam presenciado junto ao Mestre: curas de pessoas cegas, surdas, mudas, paralíticas, ‘possessas’, etc; o episódio da multiplicação dos pães e o incrível momento da transfiguração – eles precisavam ser fortalecidos nas suas convicções!

Os ensinamentos de Jesus, Suas palavras preciosas tinham, de fato, atraído e entusiasmado o ‘Grupo dos 12’. Crescia neles um encanto pelo ‘Movimento de Jesus’. Não lhes restavam  dúvidas; esse era o projeto que estavam dispostos a assumir. No entanto, ainda eram um tanto imaturos; imaginavam que, ao chegarem em Jerusalém, atingiriam capacidades semelhantes.

Ingenuamente, também cogitavam assumir lá, junto com Jesus, o poder político de Israel. Por isso, não perdiam tempo e, ao longo do caminho, já negociavam cargos entre si. Afinal, se o “Reino de Deus estava próximo” – e Jesus o dissera várias vezes – tinham que apressar-se com ‘necessários (?)’ encaminhamentos.

Interpretavam que, de Jerusalém, deveria partir uma espécie de ‘nova ordem mundial’. Transformariam as ações amorosas, aprendidas de Jesus, em políticas sociais/públicas. Deste modo, as pessoas mais vulneráveis da sociedade seriam alcançadas e beneficiadas com o recém-aprendido Evangelho de Amor – a Boa Nova da Salvação que igualmente lhes alcançara!

  1. No entanto, antes disso, era fundamental que respondessem a pergunta de Jesus: Quem dizem, por aí, que Eu Sou? / Quem vocês dizem que Eu Sou?! / A confissão de Pedro, o apressado da turma, feita pouco antes da narrativa prevista para hoje, foi: “Tu és O Cristo, o Filho do Deus Vivo!” – Mas essa confissão ‘de vida’ que os seguidores de Jesus tinham, se chocava com os anúncios de Sua paixão, sofrimento, morte e ressurreição.

A frase: “Serei entregue a mãos humanas e tirarão a Minha vida, mas ressuscitarei” – mexeu com as emoções de todos. / Nós também ficaríamos confusos, porque é complicado entender e ‘abraçar’ um projeto que tenha tão alto preço; que chegue a custar a própria vida de quem nos inspira! Ainda mais assustador é que igualmente de nós exija abnegação, sacrifício. Dá vontade de cair fora mesmo!

Somos ensinados a preferir a glória, a vida, a festa, as palmas, a saúde, a fartura, a alegria… – Óbvio! / E o texto de hoje nos apresenta justamente um dos três momentos nos quais Jesus anuncia exatamente o contrário dessa lógica do triunfo constante. Ele busca sensibilizar – ainda que não dramatizar (!) – os discípulos para as consequências do caminho ao qual se dispõem. ‘Jesus joga limpo!’

  1. O primeiro anúncio aconteceu após a confissão de Pedro, quando ele não entendeu absolutamente nada e nem aceitou o que Jesus lhe disse: “Se alguém quer vir após Mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-mE.”

O segundo anúncio acontece no texto que eu lhes li: “A caminho de Jerusalém”; embora tivesse pedido discrição, Jesus reafirma que seria entregue às autoridades. / E é então que os discípulos começam a ‘tremer na base’; temem pela própria vida. Preocupam-se com sua situação pessoal, mas ficam com receio de interrogá-lo.

Como poderia alguém rejeitar uma proposta tão boa como a do Mestre? Em absoluto, se tratava de promessas vazias; Ele anunciava soluções perfeitamente possíveis! Ora, Jesus e Seu admirável poder de transformação não combinava com dor, morte, nem com destruição.

Foi por isso que, a maioria deles havia abandonado os ‘barcos de suas vidas’, seus afazeres, para seguir Aquele que lhes encantara para um Mundo impressionantemente Novo; mundo que parecia ruir, antes mesmo de tomar a completa forma. / Havia egos e interesses feridos! Temiam fazer perguntas, pois, na primeira vez que Jesus havia tocado no assunto do sofrimento do seguimento, Pedro levara um ‘para-te-quieto’, por tê-lO contrariado.

  1. Não deveríamos ter medo de perguntar, nem mesmo de responder. O medo de perguntar resulta de nossa própria insegurança e da sensação de que a resposta pode ser realmente a confirmação daquilo que já pressentimos. Nossa intuição pode ser assustadora, quando estivermos dispostos a acolher outro entendimento.

O medo de perguntar normalmente se apresenta nos momentos mais críticos de nossa vida. Tememos respostas difíceis e suas consequências! Diante de ‘diagnósticos de toda sorte e não esperados’, facilmente desesperamos e literalmente ‘travamos’. Deixamos de vislumbrar possibilidades e é compreensível que recuemos!

Ao perceber a angústia dos discípulos, feito sábio professor da mente humana, Jesus perguntou aos desesperados alunos, a fim de ver se falariam: “Sobre o que conversavam, enquanto caminhavam?” Mas não tiveram coragem; guardaram silêncio, ainda que Jesus soubesse sobre o que tanto haviam conversado.

A questão era: Qual deles ganharia o melhor cabide de emprego; a colocação mais honrosa no seguimento a Ele: “haviam discutido entre si sobre qual deles era o maior, o mais importante.”

  1. Jesus explicou a eles de que a única saída para a salvação da arrogância estaria na conservação da humildade: “Se alguém quer ser a primeira pessoa, a mais importante de tudo – ela mesma precisa estar disposta a ser a última; ou seja, a pessoa que irá servir e importar-se com as demais.”

Quando nos projetamos ‘bons demais’, o tombo vem na mesma proporção! / É a típica pergunta-pretensão que produz constrangimentos na esfera pessoal, familiar, pública, comunitária – é preciso entender a vida de fé sob a ótica da ordem invertida!

O terceiro anúncio de Jesus sobre o ‘ônus do propósito’ aconteceu diante da pergunta hilária da mãe dos filhos de Zebedeu, quando esta lhE solicitou que seus destacados filhos, no Reino de Deus (!), se assentassem nada mais, nada menos, que um à sua direita e outro à sua esquerda.

Triste pleitear ajeites para os seus; o mundo está cheio de artimanhas assim! Por isso, é bom fazer perguntas e ‘não fugir da raia’; é dos saudáveis debates que os caminhos se clarificam.  / ‘Perguntar não ofende’; é uma grande oportunidade para ensinamentos e aprendizados recíprocos. Quem não se permite ser questionado, se coloca numa posição de superioridade:“eu já sei tudo; o que sei me basta; não preciso e não quero aprender nada que me faça mudar de opinião.”

  1. Crianças na fase dos porquês nos ensinam que, para aprender, é preciso perguntar e perguntar… E perguntar com toda naturalidade, sem preconceitos, sem segundas intenções ou maldade. / Não é de causar espanto que Jesus tenha usado como referência uma criança, dizendo que quem a acolher, recebe a Ele e ao próprio Deus. / Tomando-a nos braços, disse: “Qualquer que receber uma criança, tal como esta, em Meu Nome, a Mim Me recebe e, através de Mim, ao próprio Deus!”

Por último, aprendemos dos filósofos gregos:“Só sei que nada sei” – ‘Quanto mais aprendo, mais constato do pouco que sei.’ Respostas precisam ser constantemente ‘ventiladas’, reelaboradas; daí  o sentido das constantes perguntas! ‘São as grandes perguntas que movem a humanidade!’ Nem tudo tem resposta; perguntas difíceis requerem tempo e coragem.

Raul Seixas cantava: “Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo.”/ O gesto de Jesus propõe essa dinâmica de disposição interna! Ao abraçar e trazer para o centro uma criança indefesa, Ele quer motivar os discípulos a compreenderem de que deveriam espelhar-se nelas. Marginalizadas, confiam em Deus e vivem seu dia-a-dia! Inocentes, são representativas para tudo aquilo que é colocado à margem ou sob suspeita.

Deus transforme nosso modo de entendimento do seguimento à Sua causa. Caso contrário, feito discípulos temerosos, nos ocuparemos demais com coisas que não fazem a menor diferença no Reino de Deus. A exemplo das crianças, a vida, para ser verdadeiramente vivida e ser des-complicada, amada e protegida. A vida requer cirandas, leveza – feito brincadeira de criança, mas é algo que precisa ser levado a sério!

É preciso aprender a falar de coisas difíceis com a naturalidade e a simplicidade das crianças, para não desaprendermos a arte do encanto pela Causa do Amor.

Amém.

P. Ilmar Kieckhoefel

Sapiranga – Rio Grande do Sul (Brasilien

ilmarkieckhoefel@gmail.com

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