Mateus 21.33-46

Mateus 21.33-46

PRÉDICA PARA O 19º Domingo após Pentecostes | 08.10.23 | Mateus 21. 33-46 | Martin Dietz |

“A graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos nós. Amém.”

³³ — Escutem outra parábola. Havia um homem, dono de terras, que plantou uma vinha. Pôs uma cerca em volta dela, construiu nela um lagar, edificou uma torre e arrendou a vinha a uns lavradores. Depois, ausentou-se do país. ³⁴ Quando chegou o tempo da colheita, o dono da vinha mandou os seus servos aos lavradores, para receber os frutos que cabiam a ele. ³⁵ Mas os lavradores, agarrando os servos, espancaram um, mataram outro e apedrejaram ainda outro. ³⁶ O dono enviou ainda outros servos em maior número; e os lavradores fizeram a mesma coisa com eles. ³⁷ Por último, o dono da vinha enviou-lhes o seu próprio filho, pensando: „O meu filho eles respeitarão.“ ³⁸ Mas os lavradores, vendo o filho, disseram uns aos outros: „Este é o herdeiro; venham, vamos matá-lo e ficar com a herança dele para nós.“ ³⁹ E, agarrando-o, lançaram-no fora da vinha e o mataram. ⁴⁰ Quando, pois, vier o dono da vinha, que fará àqueles lavradores? ⁴¹ Eles responderam: — Fará perecer horrivelmente aqueles malvados e arrendará a vinha a outros lavradores que lhe entregarão os frutos no tempo certo. ⁴² Então Jesus perguntou: — Vocês nunca leram nas Escrituras: „A pedra que os construtores rejeitaram, essa veio a ser a pedra angular. Isto procede do Senhor e é maravilhoso aos nossos olhos“? ⁴³ — Portanto, eu lhes digo que o Reino de Deus será tirado de vocês e entregue a um povo que lhe produza os respectivos frutos. ⁴⁴ Todo o que cair sobre esta pedra ficará em pedaços; e aquele sobre quem ela cair ficará reduzido a pó. ⁴⁵ Os principais sacerdotes e os fariseus, ouvindo estas parábolas, entenderam que Jesus falava a respeito deles; ⁴⁶ e, embora quisessem prendê-lo, tinham medo das multidões, porque estas o consideravam como profeta.

Prezada Comunidade, irmãs e irmãos,

Afirma o ditado que “uma imagem vale mais  que mil palavras”. Quem sabe, também poderíamos formular: “Uma imagem diz mais que mil palavras”. Jesus, em sua sabedoria,  conjugou de modo singular imagens com palavras, verteu imagens em palavras. Na boca de Jesus, palavras se tornaram canal para imagens. As parábolas de Cristo atestam isso de contínuo.

Interpretando o ditado citado, concluímos:  nem mil palavras seriam capazes de interpretar adequada e suficientemente o que a imagem utilizada por Jesus, em Mt 21.33-46, tem a ensinar. Ainda mais difícil fica a situação da palavra e das palavras, se levarmos em consideração que o texto de pregação previsto para este 19º domingo após Pentecostes contém não uma, mas duas imagens: a figura dos lavradores maus e a ilustração da pedra angular.

Imagens “falam”, comunicam. Num primeiro momento, elas talvez apenas evocam memórias e associações que já estão presentes no indivíduo ou em uma determinada coletividade: uma Comunidade cristã, uma associação ou também uma sociedade. De certa maneira, as imagens – visuais, faladas ou escritas – servem como a parteira da qual já falou a antiga filosofia: servem para “despertar” algo que já está presente, mesmo que adormecido, em nós.

É o que acontece na parábola dos lavradores maus. Nela, Jesus recorre a imagens que já eram conhecidas por seus ouvintes, fazendo despertar neles determinadas associações. As leituras bíblicas de Isaías 5.1-7 e de Salmo 80.7-14 eram conhecidas das pessoas às quais Jesus falava e lhes davam um primeiro norte quanto ao entendimento do ensinamento de Jesus. Deus é o senhor da vinha, sabiam as pessoas. A vinha é o povo do Senhor, assim o ensinamento do Antigo Testamento. Isaías 5 constata que a vinha de Deus, Israel, não produziu os frutos esperados, apesar do cuidado especial que havia recebido. Salmo 80, por sua vez, traz a Deus a súplica em favor do povo escolhido, pedindo ao Senhor que não permita que sua “vinha” seja destruída.

Ao falar da vinha, Jesus conduz, portanto, seus ouvintes por uma espécie de trabalho de parto; traz à luz percepções que eles já possuíam. Mas Jesus vai além, pois, agora, ensina as pessoas a ouvirem a ilustração da vinha de uma forma nova. Pois no centro do interesse da parábola não está propriamente a vinha – o povo de Deus –, mas os responsáveis por esse povo, representados pelos lavradores.

Quem cuida da vinha, quem se sacrifica em favor do povo de Deus? V.45 declara que “os principais sacerdotes e os fariseus […] entenderam que Jesus falava a respeito deles”. Eles são representados pelos lavradores que expulsaram e mataram os enviados do senhor da vinha. Dito de maneira literal: eles são aqueles que rejeitaram e maltrataram os servos de Deus, os profetas, ao longo da história. São eles, também, que, por fim, irão se tornar culpados pela morte do filho, Jesus Cristo. A consequência indicada por Jesus é: o senhor da vinha, Deus, providenciará outros lavradores, outros líderes para o Seu povo.

À sua maneira, a parábola de Jesus reflete a respeito da relação entre a Igreja de Cristo e o povo da antiga aliança, Israel. Esse assunto era frequente e, sempre de novo, motivo de alguma inquietação, nos tempos do Novo Testamento. Em boa parte das Comunidades da IECLB, talvez pareça questão distante, embora permaneça atual em outros contextos. Se a um primeiro olhar, a questão da relação com Israel parece distante, o simples fato de aproximadamente ¾ da Bíblia serem compostos pela Escritura Sagrada dos judeus deve continuamente servir de lembrete a respeito da relação umbilical entre fé cristã e Judaísmo.

No mais, é útil observar que Jesus, de modo nenhum, declara a rejeição de Israel, mas apenas afirma que a vinha receberá outros lavradores, ou seja: que o povo de Deus será agraciado com outros, novos líderes, que correspondam ao seu chamado. Quanto à eleição do povo de Deus, em seu conjunto, valem as palavras do apóstolo Paulo: “os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis” (Rm 11.29).

Se Jesus anuncia que a liderança do povo de Deus será rejeitada e, em seu lugar, serão escolhidos novos “cuidadores da vinha de Deus”, que dizer desses novos “lavradores”? Imaginar que Jesus esteja, aqui, pensando em Pedro e nos demais discípulos bem com em seus seguidores como sendo os novos cuidadores do povo de Deus, povo constituído de judeus e não–judeus, não deve ser mera fantasia. Como eles e elas têm se desincumbido de sua tarefa? A esses não se dirige a ameaça de juízo pelo texto. Também para eles, porém, vale a declaração do Senhor: “àquele a quem muito foi dado, muito lhe será exigido; e àquele a quem muito se confia, muito mais lhe pedirão” (Lucas 12.48). Ministras, ministros e outras lideranças da Igreja recebem de Jesus uma grande dignidade; com ela, porém, também uma alta responsabilidade.

E, para encerrar: em sua parábola, Jesus fala dos servos do proprietário da vinha que são enviados aos lavradores. Trata-se de uma clara referência figurada aos profetas que, continuamente, foram enviados por Deus, e que, regularmente, foram rejeitados pelos seus ouvintes. Jesus, à sua maneira, coloca-se na linhagem profética. Ao declarar que “a vinha” será tirada dos “lavradores” e entregue a outros, Jesus se posiciona contra os “sacerdotes e fariseus”, que, por sua vez, compreendem que contra eles se dirige a parábola que lhes é anunciada.

O ministério profético é dado também aos apóstolos e seus seguidores. Pessoas incumbidas da pregação da Palavra de Deus não estão encarregadas de agradar seus ouvintes, mas de anunciar o Evangelho, que salva, bem como a lei, que condena. O profetismo da Igreja e de seus pregadores evidentemente é uma arte de difícil manuseio. Seu abuso ideológico é ameaça contínua, ainda que não se deva exigir da pessoa que prega que abdique de suas preferências ético-políticas. Outro risco consiste na tentação de se condenar os erros daqueles que não estão entre os ouvintes. O profetismo de Jesus se arrisca a “queimar o filme” com os seus ouvintes; não se contenta em falar daqueles que estão distantes e que não se importam com o que está sendo dito dentro das quatro paredes de uma igreja.

Assim sendo, concluindo, a parábola de Jesus coloca diante de nós, da Comunidade e das pessoas que pregam, a pergunta pela tarefa da qual Ministras e Ministros, também outras lideranças das Comunidades, foram incumbidos. O “Senhor da vinha” enviou e continua enviando seus mensageiros. O “filho amado” foi morto, crucificado. Todos nós, os líderes e o povo, próximos e distantes, nos tornamos culpados da morte desse que é mais que um profeta. Que o bom Deus, Pai, Filho, e Espírito Santo, nos ampare para que, dois mil anos depois de a parábola ter sido contada, sejamos fieis mensageiros da Palavra, em palavras e ações, bons administradores da vinha divina, e também ouvintes atentos da mensagem de Jesus, sempre dispostos ao arrependimento e à conversão.

“E a paz de Deus, que excede o nosso entendimento, guardará nossos corações e mentes em Cristo Jesus. Amém.”

Dr. Martin Timóteo Dietz

Lomba Grande/Novo Hamburgo – Rio Grande do Sul (Brasilien)

E-mail: martin.dietz@hotmail.com

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