O que 2021 pode esperar …

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O que 2021 pode esperar …

PRÉDICA PARA O PRIMEIRO DIA DO ANO 2021 | Texto bíblico: Filipenses 2.5-11 | Eloir Enio Weber |

O que 2021 pode esperar de nós?

Que a paz e a graça do Deus que é Pai/Mãe, Filho e Espírito Santo se manifeste em nossa vida, nos encha de esperança e abençoe este ano que iniciamos. Amém.

1º de janeiro de 2021!!! Se você está aqui é porque sobreviveu ao ano de 2020. Vocês e eu precisamos agradecer por termos passado por esse período, mesmo que tenhamos ainda alguns meses difíceis pela frente por conta da Covid19 e que os cuidados para minimizar as chances de contaminação ainda sejam muito necessários.

O que você espera do ano de 2021? Imagino que seja unânime a espera pela imunização diante do vírus que veio para trazer tanto sofrimento, tanta dor, morte e crise. No meio disso tudo, passamos a valorizar mais a saúde, a vida, o trabalho. Percebemos a fragilidade da vida humana e que, apesar dos avanços tecnológicos no tratamento de doenças, ainda estamos muito expostos, que não somos eternos e que não podemos nos dar ao direito de brincar de sermos pequenos (ou grandes??) deuses.

Esse tempo de crise sanitária nos chamou para vivermos com mais humildade diante da vida. O ser humano se acostumou a ter tudo em mãos na hora que bem entendesse; e a Covid19 veio para mostrar um outro lado: a fragilidade da vida e do sistema social no qual vivemos. Aliás, esse tempo também nos mostrou o quanto os seres humanos estão embriagados de soberba e de egoísmo; o quanto o espírito escravagista, que marcou profundamente a história humana, ainda está muito presente e ganhou novas forças e novos contornos nestes últimos anos.

Para exemplificar, trago à lembrança cenas lamentáveis que foram expostas por meio de gravações, ao longo do último ano. Atitudes de pessoas que, com a sua soberba, se acharam no direito de humilhar outros seres humanos: 1) em julho, na cidade do Rio de Janeiro, a guarda municipal fazia fiscalização para que as aglomerações fossem minimizadas. O agente chamou a atenção de um cidadão; e um moça, para defender o seu amigo, disse: “Cidadão não, engenheiro civil, formado, melhor do que você!”. 2) Já no mês de agosto, um entregador de lanches foi ofendido por um cliente no interior de São Paulo com palavras de arrogância e superioridade: “Seu lixo, quanto deve ganhar por mês, hein? Dois mil reais? Não deve ter nem onde morar.” 3) Outro caso, em novembro, em São Paulo; uma mulher estava em uma padaria e, aos gritos, anunciou que é “advogada internacional”. Ela ofendeu funcionários e clientes com xingamentos homofóbicos e racistas; em certo momento, ela jogou um papel guardanapo em uma funcionária e disse: “Sabe pra que você presta? Pra pegar os meus restos.”

Como humanidade, não deveríamos nos perguntar o que esperamos de 2021; mas sim, o que 2021 pode esperar de nós? Que tipo de ser humano social e relacional desejamos ser neste ano? O que é certo é que urge a necessidade de “baixarmos um pouco a nossa bola”, de buscarmos humildade, acolhimento, respeito e empatia nas nossas relações de convívio. Isso significa, também, não permitir que pisem em nós. Somos seres dignos, recebemos um grande valor em Jesus Cristo, que morreu e ressuscitou para nos dar dignidade. No batismo recebemos esse presente.

Diante do quadro descrito, o texto bíblico indicado para esse 1º dia de 2021, não poderia ser mais oportuno. Leio da carta aos Filipenses 2.5-11.

(Leitura do texto bíblico) 

Em 2020 tivemos eleições municipais. Certamente ouvimos muitas daquelas musiquinhas, chamadas de “jingles”, que os candidatos fazem para convencer as pessoas eleitoras a votarem neles. Digo isso porque o texto que acabamos de ouvir tem um pouco de “jingle”; mas, obviamente, com um propósito diferente do que o usado nas eleições. Esse texto é conhecido como o “Hino Cristológico”. Ele traz a essência de Cristo. Em poucos versículos, de forma poética, traz um resumo do projeto salvífico de Deus em favor da humanidade, desde a preexistência de Cristo, o seu nascimento no Natal, sua vida e seus ensinamentos de humildade e de amor, a morte obediente de Cruz para salvar a humanidade e a sua glorificação no Reino.

Neste Hino Cristológico é preciso compreender a preexistência de Cristo, ou seja, que ele já era da mesma essência de Deus desde antes do seu nascimento. Que o seu nascimento não marca o início da sua atuação, mas é o evento da encarnação daquele que sempre existiu. O Natal, que nós acabamos de celebrar e cujo tempo ainda estamos vivendo, é a festa na qual celebramos a humildade de Cristo em abrir mão da sua posição para nascer em forma humana por amor a nós e pela criação. De forma livre e espontânea, Cristo tomou a forma de pessoa para tornar-se solidário com o ser humano escravizado pelo pecado. O Natal, portanto, é a festa da empatia, da humildade. E esse também foi o teor da vida e dos ensinamentos de Jesus, conforme o nosso texto e o relato dos evangelhos. São as mesmas atitudes que estão tão em falta nestes tempos nos quais vivemos. Por isso a pergunta invertida: “O que 2021 pode esperar de nós?”.

O texto aponta para o fato de que Jesus, em sua vida terrena, não foi apenas uma pessoa entre outras. A sua humildade o levou ainda mais para baixo. Ele optou, livremente, por andar com pecadores e marginalizados. Essa obediência livre o levou à morte de cruz. Gosto muito desse texto, especialmente colocado para o início de mais um ano, porque ele coloca o Natal e a Páscoa em sintonia. E ele ressalta, também, aquilo que Lutero defendeu no tempo da Reforma: para olharmos para Cristo não devemos olhar para cima, para o céu; pelo contrário, precisamos olhar para baixo, para a miséria humana. É ali que encontramos Cristo agindo no meio das dores e das misérias e nos convidando para a ação solidária de fé, de diaconia, de acolhimento e de humildade.

O texto fica mais bonito e significativo ainda, quando se toma o contexto de vida do autor da carta, o apóstolo Paulo. A carta aos Filipenses é conhecida como a “Carta da Alegria”. Paulo, ao escrever essa carta estava enfrentando muitas situações difíceis em sua vida. Estava preso por causa do evangelho, foi caluniado, seus planos tinham sido frustrados e a sua vida estava em real perigo, por conta de uma possível condenação de morte pelas autoridades romanas da época. Apesar disso tudo, ele encontra motivação na sua fé em Jesus Cristo e afasta os sentimentos de mágoa, de revolta, de amargura ou de vingança. Longe disso, ele afirma: “Todavia, que importa? Uma vez que Cristo, de qualquer modo, está sendo pregado (ele quer dizer aqui, “anunciado”), quer por pretexto, quer por verdade, também com isto me regozijo, sim, sempre me regozijarei” (1.18).

O Hino Cristológico, ao ressaltar a humildade de Jesus e nos chamar para atitudes semelhantes, também traz um recado bem direto para nós, cristãos do século 21. Está em voga em nosso meio, de forma especial no Brasil, uma teologia que se diz cristã e que, na verdade, é nociva ao Cristo anunciado neste texto bíblico de hoje. A Teologia da Prosperidade não prega o Cristo da cruz. Antes, ela convida para vivermos de forma egoísta. O que importa é que EU seja bem-sucedido; e Deus, por causa dos méritos da minha fé, tem compromisso em me dar a prosperidade financeira. Esse tipo de teologia não me compromete com o sofrimento alheio. Aliás, inflama o sentimento de superioridade e facilita o sentimento de soberba que leva muitas pessoas a se acharem mais e melhores do que outras: “Cidadão não, engenheiro civil, formado, melhor do que você!”“Seu lixo, quanto deve ganhar por mês, hein? Dois mil reais? Não deve ter nem onde morar”“Sabe pra que você presta? Pra pegar os meus restos.”

Por outro lado, a teologia da cruz, que Lutero incansavelmente defendeu em seu tempo e nos deixou como legado, chama para o comprometimento. O Cristo na cruz, ressaltado no texto bíblico como humilde, nos leva a perceber a graça, a gratuidade do amor de Deus que nos dá dignidade e valor, mas que dá a mesma dignidade e o mesmo valor para todos os seres humanos, em qualquer situação social, faixa etária, sexo, cor ou raça. A graça de Cristo nos compromete com a justiça social, nos convida a olhar para baixo. É disso que o ano de 2021 precisa. É mais do que tempo de solidariedade, de mãos dadas para superar as chagas que a Covid19 veio para ressaltar. A Covid19 não criou a miséria, somente ressaltou a mesma, que sempre existiu.

Nesta mesma direção está o negacionismo em relação à seriedade da Covid19. O fato que leva inúmeras pessoas a desrespeitar as regras de não se aglomerar e a não usar máscara de proteção, mostra um profundo desrespeito pela vida da outra pessoa. A Covid19 mostrou para quem tem “olhos para ver e ouvidos para ouvir” que, para muitas pessoas, o que importa é a vida egoísta, não importa que alguém do meu lado será contaminado e vai morrer. O importante é que EU tenha o direito de não seguir as orientações das autoridades sanitárias cientificamente fundamentadas. O mesmo vamos enfrentar em 2021, com o advento da vacina que trará imunização diante do vírus. Inúmeras pessoas, embriagadas com o seu senso de superioridade e indestrutibilidade, vão optar, em nome do Deus da Prosperidade (e não do Cristo da Cruz) em não se imunizar, colocando em risco os seus semelhantes.

O fato do texto bíblico de hoje ressaltar que Jesus abriu mão da sua posição para, em obediência, encarnar-se em forma humana, nos dá a dimensão da responsabilidade social que a fé traz nestes tempos de pandemia. E, especialmente, para esse novo ano que estamos iniciando.

Penso que o Padre Zezinho conseguiu captar de uma forma muito bonita o sentido do Hino Cristológico e suas consequências no agir e na vida das pessoas cristãs. No refrão de uma canção muito conhecida, também o meio Luterano, ele escreveu que é necessário: “Amar como Jesus amou; sonhar como Jesus sonhou; pensar como Jesus pensou; viver como Jesus viveu. Sentir o que Jesus sentia; sorrir como Jesus sorria; e ao chegar ao fim do dia, eu sei que eu dormiria muito mais feliz.”

Eu desejo que o ano de 2021 traga consigo muitas transformações. Traga consigo a imunização diante dessa grave crise sanitária. Traga consigo mais consciência social a partir da graça de Cristo. Traga consigo pessoas com mais predisposição para assumir a humildade, como Cristo a assumiu. Que a arrogância dê lugar para a empatia. Tudo isso começa por nós. Que possamos assumir a teologia da cruz como uma forma de vida e uma forma de construir relações mais humanas, saudáveis e iguais.

Que a graça, a paz e a bênção de Deus caminhe conosco neste ano de 2021. Amém.

Pastor Eloir Enio Weber

São Leopoldo – Rio Grande do Sul, Brasilien

eloir@sinodal.com.br

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