O DIA 31 DE DEZEMBRO

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O DIA 31 DE DEZEMBRO

PRÉDICA PARA O DIA 31 DE DEZEMBRO DE 2020 | Texto bíblico:  João 10.14-16.27-29 | Harald Malschitzky |

Irmãs e irmãos em Cristo.

Um dos maiores teólogos do século passado se chamava Karl Barth, era suíço, mas lecionava mais em universidades na Alemanha. Sua obra escrita é muito vasta; suas aulas exerciam um verdadeiro fascínio sobre os estudantes. Na vida particular gostava de música, especialmente  de Mozart,  e de cuidar de suas rosas. A par disso ele se dedicava ao pastorado voluntário: Pregava em uma penitenciária  e fazia visitas,principalmente a pessoas idosas e solitárias. Numa de suas repetidas visitas a uma senhora de idade avançada, esta falou: Pastor, eu há tempo queria lhe fazer uma pergunta e deixei, mas agora que não tenho mais muita vida pela frente,  arrisco fazê-la: “Na eternidade nós vamos nos encontrar com as pessoas que, aqui na terra, nos foram caras e amigas?” “Sem dúvida”, respondeu  Barth, “mas as outras também”.

Um dos efeitos colaterais da pandemia em que estamos metidos é a mostra escancarada da  dimensão humana de ser gregária, isto é, que o ser humano, por sua natureza, busca outros seres humanos, formando grupos, associações, comunidades, municípios, estados países… Agora sentimos tremenda falta disso.  Lá no início da Bíblia nós lemos que “não é bom que o homem [ser humano] esteja só”, isso lá no início do relacionamento entre homem e mulher. Nada disso é pecado! Pecado no sentido amplo acontece quando esses grupos – seja lá quais forem – se fecham em si mesmos sem deixar espaço para outros. Sim, isso já acontece com crianças; quem não se lembra do clube do Bolinha ou do grupo da Luluzinha! Brincadeiras ingênuas, mas também reveladoras – outro(a) não entra e não tem vez.

Comunidades cristãs, igrejas, outras religiões, em geral, seguem o mesmo modelo de congregar. Na própria Bíblia temos conceitos que descrevem o fenômeno: povo, tribo, família, parentela, congregação, rebanho. Este último é o que mais aparece em diversas variações. Jesus e vale do modelo do rebanho para falar do seu povo amado. Ouçamos um dos textos clássicos das falas de Jesus:

Leitura de João 10. 14-16, 27-29

Jesus um pastor de ovelhas, alguém que arrebanha suas ovelhas, as junta, as protege. Um trabalho duro que não tem nada a ver com algumas ilustrações romantizadas que existem por aí. Ovelhas se sujam, molhadas elas – literalmente –  fedem; o pastor, em noites frias, se acomoda no meio delas, assim que ele mesmo fede. Ovelhas machucadas precisam ser carregadas e perdidas recuperadas… Em momentos de frio e tormenta as ovelhas se amontoam  e o pastor se “aninha” no meio delas….Nem todas as pessoas gostavam da companhia de pastores de ovelhas! Sua aparência e odor não eram e não são dos melhores. O conhecido quadro de Jesus, sentado tranquilamente numa pedra, cajado na mão, olhando as ovelhas em um verde pasto, retrata muito mais uma época na história da arte do que a realidade nua e crua.  Esta observação, em vez de escandalizar, conforta. As ovelhas de que Jesus fala, nós, portanto, estão longe de ser aquele rebanho bonito pastando pacificamente. Somos, isso sim, ovelhas tantas vezes desgarradas, estropiadas, briguentas, doentes e, neste momento, um rebanho angustiado pela pandemia, por parentes, amigos ou conhecidos que já foram vítimas do vírus. Corremos o risco de perder o rumo de nossas vidas! Aí é muito bom e confortante ouvir que temos um bom pastor que arrisca a própria vida em nosso favor. Fosse um mercenário, ele fugiria para lugar seguro, cuidaria de sua saúde, de seu bem estar,  como o assistimos diariamente… O bom pastor está aí, solidário, com todas suas forças  e dando a sua vida para salvar outras vidas. É bom, é confortante saber disso!

Mas no meio de sua fala, Jesus diz uma coisa que pode gerar desconforto: Há ainda outras ovelhas que precisam ser incluídas no mesmo grande rebanho. Essas ovelhas outras  são diferentes de nós em cultura, cor, língua, nacionalidade, ideologia… Jesus diz simplesmente que são outras e precisam ser juntadas. Que bom se fosse possível ouvir esta mensagem em toda a sua extensão. Vivemos tempos de ódio religioso e ideológico, ainda que muitos se proclamem cristãos pertencentes a essa ou àquela igreja e, pior, com armas na mão, não raro usando o sinal da arma em lugar do sinal da cruz – esta só enfeita uma parede! Mas, é preciso lembrar também, que as igrejas cristãs no mundo ainda estão muito agarradas às suas tradições e costumes, por melhores que sejam (eu também gosto do que herdei!) o que levanta taipas (muros) que separam, quando Jesus, o bom Pastor, nada mais quer que ajuntar todos em um rebanho; não há espaço para muros e separações, coisa tão difícil de compreender na sociedade que prefere usar preconceitos, espalhar notícias falsas, discriminar, mas também na igreja isso ainda está complicado. Jesus quer um só rebanho de letrados e iletrados, são e doentes, de quem está bem e de quem está estropiado.

E na fala de Jesus há mais: Ele não só é solidário com as ovelhas, mas as conhece as guarda em nome de Deus o Pai. Nesse rebanho as ovelhas escutam a voz do seu pastor e o seguem, não, não o seguem como em um  passeio sem compromisso, mas seguindo-o espalham solidariedade, amor e esperança a exemplo do próprio pastor. Só ter um quadro de um bom pastor pendurado na parede pode não significar nada; só serve como peça de decoração.

Últimas horas de um ano difícil e sofrido para milhões e milhões de pessoas. Neste momento, o número de mortos por dia em decorrência da pandemia cresce em muitos países. Já estamos experimentando que o vírus é muito forte. Nós estamos desnorteados e todas as pessoas na área do cuidado de doentes estão no limite de suas forças – eles mesmos no-lo dizem todos os dias! Quem se diz do rebanho de Jesus tentará fazer a sua parte, por menor que seja: Cuidados pessoais, evitar encontros ainda que familiares, evitar conscientemente centros comerciais e ruas movimentadas… São conselhos duros? Sim, mas para vermos e vivermos o novo ano o caminho de seguir ao bom Pastor é esse. Ovelhas fujonas arriscam a sua e a vida dos outros, o que é exatamente o contrário do que diz Jesus. O bom pastor está com seu rebanho, ampara quem fraqueja, consola quem chora, dá esperança a quem já não tem esperança. Permaneçamos no seu rebanho, sejamos ovelhas da primeira ou da segunda hora. Amém.

 

P.em. Harald Malschitzky

São Leopoldo – Rio Grande do Sul, Brasilien

harald.malschitzky@gmail.com

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