
2 Reis 4.42-44
PRÉDICA PARA O DIA 28 DE JULHO DE 2024 | 2 Reis 4.42-44 | Marli Lutz |
Estimadas e estimados, querida comunidade!
Nós ouvimos um texto que traz até nós um testemunho de fé, em meio a uma realidade de fome. Neste texto chama a atenção a frase, que, pela sua importância, é repetida duas vezes :
“Dá ao povo para que coma”!
Esta frase é reforçada em seu sentido com outra afirmação: “Comerão, e sobejará”.
E nós, temos fome? Fome de quê?
Nos capítulos 2 a 8 de 2 Reis são relatadas várias narrativas sobre o profeta Eliseu, seguidor do profeta Elias. Sua atuação se dá em torno de 860-840a.e.c. Em meio a cenários da vida diária e sofrida do povo, Eliseu se torna conhecido por intervir em situações dramáticas de sobrevivência, em decorrência de seca e, principalmente, de políticas internas de opressão que resultam em doença e morte de crianças pela fome e pelos sacrifícios.
Estes dois profetas, Elias e Eliseu, recebem destaque a partir de sua teologia e prática nestes espaços onde se mobilizam os setores excluídos da sociedade e da religião oficial (criança, mulher, viúva, profetas). Na simultaneidade de temas e tradições entre os vários relatos, destaca-se a valorização da prática popular de tratamentos de saúde, como enfrentamento à exploração econômica.
Portanto, estas situações de crise alimentar, escravidão, doença e morte, resultado da política opressiva e catastrófica dos reis de Samaria marcam e definem a ação profética de Eliseu, onde a solidariedade se torna decisiva para a busca de uma vida com dignidade.
Eu escrevo em um contexto específico, pós catástrofe climática ambiental, que impactou fortemente a vida das pessoas, animais e natureza, cujos efeitos ainda serão sentidos por longos anos. Não foi em consequência da seca, como no tempo de Eliseu. Mas, pelas águas excessivas e a ganância humana. Considerada a maior tragédia do estado do Rio Grande do Sul, onde a força das águas dessa terrível enchente do final de abril, deixou um cenário de devastação e desolação por onde passou. Casas, bairros inteiros, lavouras, terras agricultáveis, foram arrancados. Não havia mais comida nem água. As águas com sua força impetuosa haviam tomado tudo.
Uma grande corrente de solidariedade se formou como um grande corpo comunitário alicerçado na graça e no amor de Deus. Também ali sentimos a força das palavras de Eliseu: “Dá ao povo para que coma”!
Foi um tempo de aprendizado. Palavras com as do profeta Eliseu se tornaram uma força em meio a ausência de tudo.
A solidariedade está sendo o aprendizado para todos e todas nós. Redescobrimos o sentido da palavra empatia. Aprofundamos nossa fé e retomamos nossa esperança. Expressamos profunda gratidão a Deus por ter tocado o coração de tanta gente para ações de resgate e salvamento, caso contrário, as vítimas fatais seriam incontáveis.
Ao mesmo tempo nos damos conta que precisamos pedir perdão a Deus. No mundo inteiro esgotamos os recursos naturais, não respeitamos áreas de preservação permanente, somos favoráveis à flexibilização das leis de proteção ambiental, silenciamos diante da especulação imobiliária, da monocultura, da liberação e uso de agrotóxicos… Grandes áreas de terra vêm sofrendo sob o impacto dessa ação desastrosa. O volume de água dos rios e córregos, cada dia mais assoreados, atingiram recorde histórico. Tudo isso e muito mais, devido à ganância que toma conta do ser humano.
A vida não vale mais do que o aumento do capital? Não temos monarquias, como no tempo de Eliseu, mas, os interesses de poucos continuarão se sobrepondo ao clamor pela vida da natureza que geme e se contorce em dor? (Romanos 8.22)
A natureza não suporta mais esse impacto. A humanidade sucumbe junto com ela. Temos um longo caminho pela frente. Os tempos de adversidade estão aí, e, diante de nós teremos tempos mais severos caso não tomarmos medidas preventivas sérias. A fé em Jesus Cristo nos conclama a lançarmos sinais de “vida em abundância” (João 10.10).
Somos aprendizes da solidariedade! A ajuda mútua tem fortalecido a nossa esperança. “Carreguem a carga uns dos outros, umas das outras”, lembra o apóstolo Paulo (Gálatas 6.2). Pensemos em uma economia justa, solidária e ecológica. E é no amor que aprendemos a não repetir os mesmos erros. Pois neles estaremos cada vez mais próximos a um colapso total.
A inclemência da natureza não é castigo de Deus, é consequência de nossos atos. Deus é amor e ama o mundo, a sua criação. O Evangelho não nos autoriza a repassarmos nossas responsabilidades para Deus. Precisamos nos unir em torno do objetivo comum, a preservação da vida.
Precisamos nos revestir de Cristo (Gálatas 3.27), vestindo-nos de humildade, reconhecendo nossos erros e assumir, com coragem evangélica o enfrentamento à emergência ambiental e climática que assola a humanidade.
Tenhamos alento, coragem e uma fé amorosa, alicerçada na graça, dando nossa contribuição profética como Igreja de Jesus Cristo, que está e estará conosco até o fim dos tempos. Que juntos e juntas clamemos:
Senhor, dá pão a quem tem fome, e fome de justiça a quem tem pão!
Amém.
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Pastora Marli Lutz
Porto Alegre – Rio Grande do Sul (Brasilien)
marlilutz@yahoo.com.br