Deuteronômio 5.12-15

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PRÉDICA PARA O2.DOMINGO DE PENTECOSTES | 2 DE JUNHJO DE 2024 | Texto bíblico: Deuteronômio 5.12-15 | Martin Dietz |

“A graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos nós. Amém.”

12 — „Guarde o dia de sábado, para o santificar, como o Senhor, seu Deus, lhe ordenou.13 Seis dias você trabalhará e fará toda a sua obra,14 mas o sétimo dia é o sábado dedicado ao Senhor, seu Deus; não faça nenhum trabalho nesse dia, nem você, nem o seu filho, nem a sua filha, nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento ou qualquer outro dos seus animais, nem o estrangeiro das suas portas para dentro, para que o seu servo e a sua serva descansem como você.15 Lembre-se de que você foi escravo na terra do Egito e que o Senhor, seu Deus, o tirou de lá com mão poderosa e braço estendido. Por isso o Senhor, seu Deus, ordenou que você guardasse o dia de sábado.“

Prezada Comunidade, irmãs e irmãos,

“Devemos temer e amar a Deus e, por isso, não desprezar a pregação e a sua palavra; mas devemos ter respeito por ela, ouvi-la e estudá-la com gosto”. Assim, Martim Lutero explica aquele que, na contagem dos Catecismos do Reformador, é o terceiro Mandamento. Pelo menos a um primeiro olhar, nós, pessoas que se encontram no culto e que, hoje, ouvem a pregação sobre Dt 5.12-15, parecemos estar entre os bons cumpridores do preceito divino. Embora o texto deixe transparecer que o próprio descanso já constitui a santificação do “sábado”, o aspecto religioso da santificação não precisa (nem deve) ser esquecido. É salutar estarmos reunidos como Comunidade cristã.

Igualmente bom, porém, é que observemos o caráter evangélico tanto do Mandamento divino quanto do culto. Culto é oportunidade, graça, presente concedido a nós, Comunidade; não é obrigação a ser cumprida com Deus ou até com o pastor. Quem falta ao culto, não falha com uma obrigação, mas deixa de receber a bênção de louvor, comunhão, reflexão etc. que ao culto está associada.

Esse destaque à compreensão evangélica do Mandamento conecta Dt 5.12-15 ao Evangelho deste domingo, Mc 2.23-3.6. No Evangelho, Jesus permite a seus discípulos que, em dia de sábado, colham espigas; também em um sábado, Jesus cura um doente, o que, para os mestres da Lei do seu tempo, era considerado como trabalho. Ao assim fazer, Jesus não transgrediu apenas a assim chamada “tradição dos anciãos” (cf. Mc 7.1-13), mas ousou desobedecer a um explícito mandamento de Deus. E nós, de que lado ficamos: de Jesus ou da lei divina, conforme anunciada em Dt 5? A atitude de Jesus, em todo o caso, não deve servir de bem-vinda desculpa para que nós arbitrariamente ignoremos o texto bíblico que estamos meditando. Por outro lado, ao fazer o que fez, em pleno sábado, Jesus ensinou de que maneira devemos observar o preceito divino: não de forma cega e legalista; mas orientados pelo duplo mandamento do amor a Deus e ao próximo.

Foi essa orientação no chamado duplo mandamento do amor que deu ao Reformador Martim Lutero a liberdade de, nos seus Catecismos, chamar o “sábado” de “dia de descanso”. Afinal, embora o próprio Lutero compreenda os Dez Mandamentos como preceitos que exigem, cobram e, por isso, também condenam os seus transgressores, ele também percebeu o aspecto evangélico dos Mandamentos. No caso específico do Mandamento  que ordena a observância do dia de descanso, Lutero enxerga nele um indício e um anúncio salutar de que não somos resultado de nosso esforço e mérito, mas nos devemos por inteiro à graça, à bondade e à generosidade de Deus, nosso Pai Criador e Mantenedor da vida.

Enquanto no Antigo Testamento o sétimo dia da semana é o dia de descanso, para a Igreja Cristã o primeiro dia da semana passou a ser o Dia do Senhor, dies dominicus. Essa mudança do dia de descanso do último para o primeiro dia da semana coloca um acento bem específico na relação entre trabalho e descanso. O domingo como dia de descanso testifica que, antes do nosso trabalho (que realizamos do segundo ao sexto ou sétimo dia), vem o descanso. À sua maneira, o domingo se torna, portanto, uma forma de, semanalmente, sermos lembrados do que significa o “ser criança” ensinado por Jesus: primeiro, “mamamos e dormimos” para, depois, com o tempo, sermos capacitados à atividade produtiva. Algo parecido ensina o dia judaico, que inicia com o anoitecer, ou seja: com o período de descanso.

O Mandamento ordena o descanso no sétimo dia da semana. Em nosso mundo (pós-)moderno, nem todas as pessoas possuem a o direito e a possibilidade do repouso dominical. Quando  possuem, não raro preferem (e precisam) aproveitar o dia para o descanso exatamente para repousar ou se ocupar de outra forma, em vez de fazer uso da oferta do culto. Nós que, neste fim de semana, estamos reunidos, como Comunidade cristã, podemos nos dar por felizes, por nos ser concedida a graça de nos encontrarmos, como irmãs e irmãos, para sermos lembrados de que não somos frutos do nosso trabalho, mas nos devemos à bondade de Deus. Se alguns não podem e outros não querem participar do culto, o sino que convida para a celebração comunitária é, continuamente, lembrete e sinal dessa oferta que continuamente nos é dirigida.

De segunda- a sexta-feira, mas mesmo no sábado e no domingo, somos cobrados e exigidos de todos os lados, por meio da pressão por produtividade que nos alcança pelos meios de comunicação e pela sociedade. Mas também cada um de nós impõe a si mesmo a sua taxa de cobrança. Formulado em linguagem religiosa: o anseio por salvação pelas obras, tão condenado pelos Reformadores, segue nos rondando de todos os lados; atualmente, não mais como esperança por redenção eterna, mas terrena. Não estamos mais em busca de ir para o céu, mas de sermos felizes. Nesse intuito de nos autoconstruir, nos sobrecarregamos; ficamos cansados, esgotados. Sobrecarregados do trabalho, depositamos expectativas igualmente absolutas sobre o lazer, que não pode ser ócio, mas necessita de constante ocupação. Também ele, porém, é incapaz de conferir sentido à existência; resta, então, a decepção.

O Mandamento que ordena a observância do dia de descanso possui caráter profundamente evangélico. Ele é boa notícia, porque nos permite repousar. Lembra, como já comentamos, que não somos produto do nosso trabalho, mas da bondade divina, da graça do Deus que liberta. O culto deveria ser espaço em que essa mensagem é pregada e vivida. Não ignoramos, porém, que também pastores e padres estão continuamente tentados a atiçar pessoas ao ativismo, das mais diferentes espécies. Afinal, como Igreja, não queremos ser taxados de acomodados ou mesmo de irrelevantes. O ano da Igreja oferece incontáveis oportunidades de chamado à prática de boas obras. Se, todavia, o sinal indicado por Dt 5.12-15 não for observado por nós, permaneceremos reféns das ideologias que nos ceram e que julgamos combater.

O Mandamento divino é, temos dito, Evangelho, boa-notícia, graça, presente. Por outro lado, não deixa de ser aquilo que Martim Lutero caracterizou como “Lei”, pois lembra da limitação daquilo que fazemos. Mais tardar a morte colocará um fim ao nosso labor; essa é uma limitação. Porém, não apenas o tempo, mas também nosso conhecimento é limitado; por mais que o tenhamos ampliado, ele não é infinito. Não por último, o pecado configura o limite por excelência: não estamos acima de toda a crítica, mas continuamente sujeito a erros e, por isso, constantemente carentes de perdão. Somente isso, já deveria ser razão suficiente para buscarmos a comunhão semanal de irmãs e irmãos para ouvir, de contínuo, a mensagem da nossa salvação, terrena e eterna, em Cristo.

Resumindo e concluindo: temos motivo de sobra para dar a devida atenção ao mandamento divino e, quando e onde possuímos essa possibilidade, “guardar o ‘sábado’ para o santificar”. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça!

“E a paz de Deus, que excede todo o nosso entendimento, guardará nossos corações e mentes em Cristo Jesus. Amém.”

P.Dr. Martin Timóteo Dietz

Novo Hamburgo – Rio Grande do Sul (Brasilien)

martin.dietz@hotmail.com