
Marcos 1.1-8
PRÉDICA PARA O 2º DOMINGO DE ADVENTO – 10 DE DEZEMBRO DE 2023 | Texto da prédica: Marcos 1.1-8 | Gerson Acker |
Havia um grupo de amigos que sempre se reunia para jogar futebol nos
fins de semana. Todos eles eram muito bons naquilo que faziam, mas havia um
garoto chamado Luís que sempre ficava na reserva, não tendo muita
oportunidade de entrar em campo. Apesar de se sentir frustrado com a
situação, Luís nunca deixou de apoiar os companheiros durante as partidas.
Ele sempre os incentivava, dava conselhos e torcia por eles. Por mais que
quisesse jogar mais, ele entendia sua posição e não deixava que isso afetasse
sua amizade com o grupo.
Certo dia, durante um jogo muito importante, um dos jogadores
machucou o tornozelo e precisou sair de campo. Sem hesitar, o técnico
chamou Luís para entrar em seu lugar. O garoto ficou muito animado e decidiu
aproveitar ao máximo aquela oportunidade. Durante todo o jogo, Luís se
esforçou ao máximo, usando todas as habilidades que tinha. Ele não fez
nenhum gol, mas suas assistências e os seus passes de bola foram
fundamentais para outros jogadores do time marcarem os gols da vitória. No
final da partida, os jogadores levantaram Luís nos ombros, comemorando sua
grande atuação. Com um sorriso no rosto, o garoto percebeu que, apesar de
não ter sido o protagonista daquela história, seu papel como coadjuvante foi
fundamental para o sucesso da equipe. Portanto, há momentos em que ser um
bom coadjuvante é tudo o que se precisa para fazer a diferença.
Os coadjuvantes são personagens fundamentais em uma história,
apesar de não serem os protagonistas. Eles ajudam a construir a trama,
fornecem suporte emocional aos personagens principais e, muitas vezes,
podem ser responsáveis por dar profundidade à história, mostrando diferentes
pontos de vista e personalidades distintas. Por isso, é importante que esses
personagens sejam bem construídos e tenham características marcantes que
os diferenciem dos demais. Sem eles, a história seria monótona e sem graça,
pois um bom coadjuvante é capaz sustentar a trama e apontar para o
protagonista.
No evangelho de Marcos 1.1-8, João Batista é apresentado como o
mensageiro que prepara o caminho para a chegada de Jesus – João é o
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coadjuvante que abre a cena para o protagonista que é o Cristo. O Ministério
de João Batista é descrito brevemente nos quatro evangelhos. A narrativa dos
evangelhos sinóticos é bem similar, pois apresenta João como um pregador
que anunciava a chegada do Reino de Deus e conclamava as pessoas ao
arrependimento.
O chamado ao arrependimento de João assemelha-se, em traços
essenciais, ao chamado ao arrependimento dos essênios – um grupo político
religioso, que assim como fariseus e saduceus exercia influência na sociedade
daquele tempo. Os essênios exigem, como João Batista, o arrependimento de
todos, pois todo o povo de Israel se afastou de Deus; também eles chamam ao
arrependimento face à proximidade do juízo final; arrependimento também para
eles, é uma renúncia única e total frente ao que houve até agora.
A diferença entre o João e os essênios se dá na concepção de
arrependimento. Para os essênios arrependimento significa entrar na aliança,
isto é, entrar na seita e no seu sistema de ensino e prática da Torá. Em
contraposição, João Batista não reúne uma comunidade especial, o seu
chamado ao arrependimento não se precipita numa nova organização sob a lei,
mas vai em direção ao encontro escatológico definitivo com Deus.
O próprio João Batista entendeu e deixou claro que a sua pregação e o
seu batismo tinham como objetivo preparar o caminho para o Senhor. João
entende-se como coadjuvante no plano da salvação. O Batista dirá: “Após mim
vem aquele que é mais poderoso do que eu” (v.7). João Batista ocupa uma
posição única na história da redenção. É considerado o último dos profetas do
Antigo Testamento e como tal aponta para o tempo do cumprimento do Reino.
Porém, João enxerga-se abaixo de um escravo, aquele que sequer é digno de
curvar-se para desatar as correias das sandálias do amo (v.7).
Tradicionalmente conhecemos o jargão “Advento é tempo de
preparação”. De fato, muito se prepara nessa época do ano. Nas casas, faxina
e decoração; no comércio, vitrines enfeitadas e bombardeio de promoções para
presentear; na vida comunitária, organizam-se as celebrações especiais da
época, os coros ensaiam cantigas natalinas e muito comum é a preparação de
peças de teatro para o Natal.
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Augusto Boal, teatrólogo, afirma que “no sentido mais arcaico do termo,
teatro é a capacidade dos seres humanos de se observarem a si mesmos em
ação. Os humanos são capazes de se ver no ato de ver, capazes de pensar
suas emoções e de se emocionar com seus pensamentos. Podem se ver aqui,
em se imaginar adiante, podem se ver como são agora e se imaginar como
serão amanhã” (BOAL, 2014, p. 14). Para Boal, todo mundo atua, age,
interpreta. Somos todos atores e atrizes. Até mesmo os atores e atrizes! Teatro
é algo que existe dentro de cada ser humano e pode ser praticado na solidão
de um elevador, em frente a um espelho, no Maracanã ou em praça pública
para milhares de espectadores. Em qualquer lugar, até mesmo dentro dos
teatros!
O evangelista Marcos apresenta João Batista como o precursor de
Jesus, aquele que prepara o caminho para a vinda do Salvador, porém que
afirma que o que vem após ele é mais poderoso, a ponto de não ser digno de
desamarrar suas sandálias. No cenário descrito, João Batista coloca-se como
coadjuvante no plano da salvação e aponta categoricamente para o
protagonista da trama: Jesus Cristo.
Nossa ideia de “protagonista” nasce a partir do teatro e da literatura.
Somos constantemente confrontados e confrontadas com a ideia de que
precisamos ser protagonistas da nossa vida. Não discordamos disso
obviamente. É salutar que cada pessoa desenvolva condições sociopolítico-
emocionais e espirituais de entender-se como ser íntegro e capaz de tomada
de decisões. O problema reside no discurso que soma a ideia de
“protagonismo” à ideia de “individualidade”, ou seja, pela extrema necessidade
de ser sempre protagonista, a coletividade sucumbe, pois ninguém quer se
perceber como coadjuvante.
Advento é tempo de preparação para o Natal. Atores e atrizes na
preparação para uma peça teatral, estudam as características da personagem
à qual darão vida. É importante para as pessoas cristãs, conhecerem algumas
características desse coadjuvante chamado João Batista, para se prepararem
para o Natal e para a vida como um todo. Quando pensamos em
características de João Batista, associamos sua personagem à:
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- Honestidade: João Batista demonstrou uma forte moral e ética, a ponto
de não hesitar em desafiar as autoridades político-religiosas de seu
tempo diante de situações injustas e erradas.
- Humildade: João Batista nunca procurou atenção ou fama para si
mesmo, mas sim para o Messias. Ele vivia de modo simples, como
revelam suas vestes e alimentação. Não deixou as multidões inflarem
seu ego.
- Coragem: João Batista era corajoso e ousado em sua pregação,
chamando as pessoas ao arrependimento integral e à mudança de vida.
Ele não hesitou em confrontar os fariseus e outros líderes religiosos
quando percebeu que estavam hipocritamente desviados da vontade de
Deus.
- Diaconia: João Batista colocou as necessidades dos outros acima de si
mesmo, trabalhando duro para cuidar das pessoas e compartilhar a
mensagem de Deus com todas as pessoas que encontrava.
- Dedicação à Palavra de Deus: João Batista, como membro dos
essênios, conhecia a Palavra de Deus. Ele entendia que a verdadeira
transformação vem do conhecimento da vontade de Deus e da
obediência a ela.
No plano da salvação, toda pessoa cristã têm um papel importante a
desempenhar, porém, na leitura do primeiro capítulo do script, digo, do
evangelho de Marcos, a constatação é de que nesse plano, assim como João
Batista, a pessoa cristã é coadjuvante. Quando pensamos no papel de
coadjuvante, incorremos no risco de achá-lo sem importância e sem destaque
suficiente. No mundo da teledramaturgia vemos inúmeros personagens
coadjuvantes que brilham e se destacam nas tramas, às vezes até ofuscando o
protagonista. Na vivência comunitária, coadjuvantes do Reino de Deus são
chamados a liderar e a fazer a diferença com seus dons sem ofuscar o Cristo –
é dele a Missão! Eis um belo desafio para este Advento: Exercer com fieldade
seu papel de coadjuvante! Que Deus nos inspire e dirija. Amém.
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Oração: Bondoso Deus! João Batista pregou e viveu o arrependimento e a
transformação de vidas. É neste testemunho que nos inspiramos nesse tempo
de Advento. Nós te pedimos que nos ajude a preparar o caminho para o
Senhor em nossos corações, para que possamos estar prontos para recebê-lo
e testemunhar sua mensagem de amor e salvação a todas as pessoas. Não
queremos honras ou glórias por isso, desejamos apenas ser coadjuvantes do
teu Reino. Por Cristo Jesus, que vive e reina Contigo e o Santo Espírito hoje e
sempre amém
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- Gerson Acker
Nova Friburgo – Rio de Janeiro (Brasilien)