Marcos 6.1-13

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PRÉDICA Para o 7º DOMINGO APÓS PENTECOSTES | 07.07.2024 | Marcos 6.1-13 | Valdir Hobus |

Estimada comunidade,

Graça e paz da parte de nosso bondoso Deus.

Nosso texto nos convida para passar um dia com Jesus. Normalmente imaginamos a vida cotidiana de Jesus com seus discípulos com um ar de conto de fadas. Jesus caminhando por belas paisagens, encontrando pessoas, realizando seus milagres, sempre acompanhado por um grupo de pessoas solícitas e receptivas.

Contudo, esta não é a realidade. Muito mais frequente que momentos de tranquilidade e alegrias, são os momentos de tensão, de confronto e de desafios na caminhada de Jesus rumo à cruz.

Marcos nos traz de volta à terra. Nem tudo são flores, sonhos e encantos. Jesus está de volta à sua terra natal, onde cresceu e viveu boa parte de sua vida. Lá ele ensina na sinagoga, e muitos se admiram com sua sabedoria. Contudo, há questionamentos: “Não é este o carpinteiro, filho de Maria, e irmão de Tiago, e de José, e de Judas e de Simão? e não estão aqui conosco suas irmãs? E escandalizavam-se nele.” V.3

É nesse contexto que Jesus chama os seus discípulos para um momento decisivo de seu discipulado: O envio. É num dos momentos menos gloriosos, marcado por questionamentos, que Jesus decide que chegou a hora de enviar os doze para um estágio prático. O pano de fundo é exatamente este: “Não pensem que vai ser fácil. Não esperem ser recebidos e acolhidos por todos que vos encontrarem. Estejam preparados para a rejeição.”

Este envio traz consigo algumas recomendações importantes:

1: Não levem nada de valor

O reino de Deus é fundamentalmente oposto à cultura do mérito, do pensamento de barganha ou conquista. A mensagem do Reino traz uma nova visão, a gratuidade. A orientação de Jesus é que seus discípulos não levem nada de valor. Mateus registra até que eles deveriam ir descalços. (Mateus 10.9)

Quem conhece a região da Palestina sabe das dificuldades encontradas: Terrenos hostis, pedras e espinhos, deserto, escassez, noites geladas e dias escaldantes. Além, é claro, da dificuldade de encontrar alimento e água. Não é um passeio no parque num domingo de manhã.

Talvez algum dos discípulos tenha perguntado: “Mestre, como vamos sobreviver? Como vamos nos manter? O que vamos comer?” E a resposta é muito clara: “O trabalhador é digno de seu alimento.” (Mateus 10.10) Contem com a hospitalidade, com o cuidado daqueles que vos acolherem.

Mas, para completar o desfio, eles estão sendo enviados sem nada que pudesse despertar qualquer interesse por parte de quem os encontrasse. Não tinham nada que despertasse a menor inclinação à hospitalidade. Não tinham nem ouro, nem prata, nem belas túnicas, sem status ou posição social que fizesse deles pessoas desejáveis como companhia. Eram muito mais parecidos com um andarilho do que com aqueles vendedores bem apresentados que aparecem em nossas portas.

Daquela maneira, absolutamente vazios, tudo o que podiam fazer e esperar que acontecesse, era despertar nas pessoas o espirito da gratuidade.

Esta é a lógica do funcionamento do Reino de Deus. Estamos vazios de tudo aquilo que possa parecer moeda de troca, de negociação ou de merecimento. Mas, as pessoas são chamadas a nos receber e acolher assim mesmo. Então, quando nos encontramos assim, despojados de tudo aquilo que nos traz segurança e orgulho, é que podemos realmente experimentar o cuidado de Deus.

Aqueles discípulos que mais pareciam andarilhos, ofereciam a mensagem do Reino de Deus, que de graça receberam e de graça repartiam. O Reino de Deus é o que traz verdadeiro sentido, preenche o vazio, sustenta e dá vida plena. Como um tesouro de inestimável valor embrulhado em um saco de papel, assim era a mensagem do Reino nas mãos daqueles homens.

Quando acolhemos o Reino de Deus que nos é oferecido de graça, pela Graça, então se percebe o milagre: a cultura do mérito, da conquista, do comércio são vencidas pela lógica da gratuidade e da generosidade.

  1. Contem com a hospitalidade

Aqueles discípulos saíram pelas cidades e vilas despojados, sem recursos e eram recebidos e hospedados por pessoas de boa vontade. Hospitalidade sempre foi um tema valiosos nos relatos bíblicos, desde os tempos de Abraão, que acolheu o anjo do Senhor na hora mais quente do dia e preparou um banquete.

O Evangelista Lucas, ao contar esse mesmo episódio de Marcos, ressalta que os discípulos deveriam  se alimentar de tudo aquilo que as pessoas colocavam à mesa. Assim, a tarefa deles é distribuir de graça a boa notícia do Reino, e de graça eles seriam sustentados.

No Reino de Deus não há espaço para a compra e venda, a barganha. O que fazemos pelo Reino, o fazemos porque sabemos que é o que devemos fazer como discípulos de Cristo. Porque temos um compromisso com o Reino. Nosso coração é impulsionado pelo amor de Deus. Como diz em Atos 4.20: “Não podemos deixar de falar do que temos visto e ouvido”.

Trabalhar no Reino de Deus não é profissão, é vocação. Os discípulos sabem que quem trabalha é digno de seu salário, mas não é o salário que os motiva a trabalhar, e sim seu comprometimento com a mensagem do Reino. Por isso, a hospitalidade é sem dúvidas uma marca do Reino.

  1. A mensagem dos enviados

Jesus deixa claro, porém, que a tarefa não seria fácil. Assim como ele foi rejeitado, incompreendido e até hostilizado, também os discípulos o seriam. A mensagem do Reino não seria bem-vinda em todos os lugares. Especialmente por ser uma mensagem contrária à lógica do mundo. Em um sistema de lucros, de disputa por poder, de barganhas e negociatas, falar de graça, generosidade e bondade se torna uma afronta.

Os discípulos são inclusive autorizados a manifestarem seu desagrado sacudindo o pó da sandália ao saírem das cidades onde não foram recebidos. Esse gesto, fazendo referência ao profete Ezequiel, é um testemunho contra aqueles que rejeitaram a mensagem do Reino e tem um aviso pesado de juízo.

Mateus, em sua narrativa, porém acrescenta que eles encontrariam casas onde seriam bem-vindos. Ali os discípulos deveriam deixar sua paz.

Acolher os discípulos significava acolher o próprio Jesus. Acolher aqueles que anunciam a mensagem do Reino de Deus equivale a acolher o próprio reino anunciado. E por isso, aos que o fazem, é anunciada a paz.

O termo hebraico shalom que traduzimos como paz é muito mais do que paz. Shalom é prosperidade, fartura, abundância. Ou seja, Shalom é o Reino de Deus, e onde o Reino de Deus se faz presente, há plenitude, fraternidade e generosidade.

Receber a Paz de Deus é questão de hospitalidade, partilha, vida plena e gratuidade.  Aqueles que acolhes os portadores dessa mensagem passam a viver na perspectiva da comunhão, da busca por uma vida plena, justa e digna para todas as pessoas.

Concluindo

Pouca coisa mudou daquele tempo até hoje. A mensagem do Reino ainda encontra dificuldades de ser acolhida. Talvez não com a mesma intensidade ou obviedade. Mas, o desafio continua o mesmo. Anunciar o Reino de Deus continua sendo um ato de oposição ao sistema de barganhas, de méritos e negociações. O Reino de Deus continua sendo marcado pelo espirito de gratuidade, generosidade e partilha.

Que Deus nos fortaleça, e que encontremos hospitalidade em nosso caminho. Amém.

P. Valdir Hobus

Ijuí – Rio Grande do Sul (Brasilien)

vhobus@gmail.com