
Romanos 8.22-27
PRÉDICA PARA O DOMINGO DE PENTSCOSTES 2024 | 19 de maio de 2024 | Romanos 8.22-27 | Geraldo Graf |
Irmãos e irmãs em Cristo!
Saúdo a comunidade reunida neste Domingo de Pentecostes, neste dia em que celebramos a manifestação do Espírito Santo na da Igreja, conforme lemos em Atos 2. E o fazemos também em meio às comemorações dos 200 anos da presença luterana no Brasil, outra ação maravilhosa de Deus por meio do seu Espírito. Faço a saudação, repetindo o versículo 26 de Romanos 8 , texto bíblico indicado para a mensagem deste dia: “O Espírito de Deus vem nos ajudar na nossa fraqueza, pois não sabemos como devemos orar, mas o Espírito de Deus, com gemidos que não podem ser explicados por palavras, pede a Deus em nosso favor”.
O Espírito de Deus vem nos ajudar na nossa fraqueza!” – Este é o tema de nossa reflexão neste Domingo de Pentecostes. Nos versículos 22,23 e 26 de Romanos 8, o apóstolo Paulo escreve que a criação inteira geme e sofre. Também nós gememos, enquanto esperamos que Deus liberte toda a criação do mal que a acomete. Movidos pelo Espírito Santo, temos essa esperança e o fazemos com paciência e perseverança. Oramos hoje, suplicando que Deus nos ilumine com o seu Espírito, para que a sua palavra faça arder o nosso coração.
Tomemos como referência os seguidores de Jesus. Eles foram testemunhas da presença e das atividades do Salvador enquanto ele viveu na Palestina. Eles estiveram presentes na sua crucificação, testemunharam a sua ressurreição e sua ascensão. No entanto, o que deveria ser motivo de festa e de exultação, transformou-se numa manifestação de medo e terror. Por isso, cinquenta dias após a Páscoa, os discípulos estavam reunidos em Jerusalém, escondidos e com portas trancadas, com medo das autoridades romanas e da liderança do Templo, com medo das mesmas pessoas, que tinham prendido e crucificado Jesus. Os discípulos estavam aterrorizados. Caso fossem identificados como seguidores de Jesus, poderiam ter o mesmo fim que ele. Sentiam-se abandonados e sem perspectivas. Evitavam falar sobre Jesus publicamente. Então aconteceu o milagre: Deus derramou o seu Espírito sobre aquele grupo amedrontado e confuso, arrancando os discípulos do pânico, do desânimo e da acomodação. O Espírito Santo acabou com o medo deles, concedendo-lhes coragem para anunciar Jesus publicamente e não mais temer os possíveis riscos de uma ação pública. Transformados pelo Espírito Santo, os agora apóstolos controlaram seus medos, foram transformados e levaram essa transformação de mentes e corações para o testemunho e para a prática da sua fé. Assim surgiu a Igreja. Assim Deus fez e continua fazendo Igreja, por meio da ação do Espírito Santo, capacitando pessoas para agirem em prol de uma vida nova e plena em comunhão com Cristo e entre as pessoas.
A criação geme e também nós gememos! Assim afirma o texto bíblico. O que significa isso? Queremos destacar dois aspectos, que contribuem para a compreensão da mensagem bíblica neste Domingo de Pentecostes:
1- O gemido é uma expressão da consciência da transitoriedade da vida, quando se percebe que a vida não é eterna neste mundo, que tudo o que conquistamos fica para trás, enquanto nós passamos. A Bíblia expressa isto, dizendo que “o salário do pecado é a morte” (Romanos 6.23). Damo-nos conta disso mais fortemente, quando experimentamos doenças, perdas e lutos, quando ciclos se fecham, quando percebemos que nada é eterno aqui na terra. Algumas coisas e seres passam mais rapidamente, outros, mais lentamente. Mas tudo e todos passam e também nós, filhos e filhas de Deus. E seres racionais que somos, temos a plena consciência disso. Por isso também gememos e lamentamos. Isso é inerente à nossa natureza humana. Porém, na condição de pessoas que pertencem a Deus, que creem na sua misericordiosa bondade e no seu eterno amor, nós o fazemos com paciência e esperança. E como conseguimos fazer isso? Justamente aí entra a ação do Espírito Santo. É como afirma o apóstolo Paulo em 2 Coríntios 5.4: “Gememos aflitos, enquanto vivemos nesta barraca, que é o nosso corpo… Desejamos receber o corpo celestial para que a vida faça com o que é mortal desapareça”. Sim, mesmo como cristãos e comunidade de Jesus Cristo nós gememos, mas na esperança de que existe algo maior do que a mera transitoriedade da vida. Aguardamos a vida plena e eterna, prometida por Deus através de Jesus Cristo. E Deus nos deu o seu Espírito Santo como garantia de tudo isso. E é o Espírito Santo que nos encoraja a crer, confiar e orar, a suplicar por esta vida plena junto a Deus. É esta promessa que nos anima e fortalece para enfrentarmos nossos medos, nossos sofrimentos nossas limitações e nossas dificuldades. É o que nos anima a vencer nosso egoísmo e nossas “portas trancadas”, fazendo-nos buscar o bem-estar para o nosso próximo e cuidar uns dos outros como povo de Deus – a Igreja!
2- O gemido também expressa todo tipo de violência contra a boa criação de Deus, que afeta os seres humanos, o meio ambiente, as plantas, os animais, os rios e as florestas. Diferente do curso normal da vida dentro da perspectiva da transitoriedade, contra o qual nada podemos fazer, a agressão contra a boa criação de Deus ceifa vidas e causa sofrimento indevidamente. Também aqui o Espírito Santo vem nos auxiliar, para que não permaneçamos escondidos e acomodados. Somos lembrados que Deus nos chama para cuidar de e preservar a sua boa criação (Gênesis 2.15a). Estes gemidos são cada vez mais fortes e presentes no dia a dia. Não temos como nos esconder ou ignorar os acontecimentos: indústrias da guerra, ódio contra as pessoas que pensam diferente, violência, racismo, homofobia, xenofobia, feminicídio, exploração indiscriminada dos recursos naturais, poluição, desagregação da vida familiar, comunitária e social, desastres da natureza, que já não são mais tão naturais assim (aquecimento global), fome, pandemia, falta de assistência à saúde, à moradia digna, à alimentação, à educação. Ao mesmo tempo em que se exalta a fortuna de uns poucos bilionários, a grande maioria da população mundial padece por falta de recursos básicos para a sobrevivência (há poucos dias aportou nas costas brasileiras um barco repleto de cadáveres, provavelmente migrantes africanos, que queriam tentar uma nova vida na Europa ou na América). É uma lista muito grande de sofrimentos, que causam gemidos e mais gemidos. E não dá para ficar indiferente diante dos mesmos. E quando a gente é tentado a se fechar em si mesmo, dizendo que não tem condições para enfrentar as causas desses gemidos, Deus manda o seu Espírito e nos sacode, acorda, transforma, fortalece e envia.
As duas situações de sofrimento acima citadas e expressadas com gemidos da criação como um todo podem ser comparadas com o medo e o temor dos discípulos de Jesus na véspera de Pentecostes. Assim como eles, também nós nos sentimos de mãos amarradas diante de muitos sofrimentos e de muitas situações extremas. E é justamente por isso que o apóstolo Paulo retoma o tema de Pentecostes na Carta aos Romanos. Nós não estamos sozinhos à mercê de um destino ingrato e cruel. Deus nos envia o seu Espírito, que geme e ora conosco, que enfrenta junto conosco os nosso medos e as nossas fraquezas, que desperta a nossa esperança e nos fortalece e encoraja para crer, testemunhar agir
Em Romanos 8, o apóstolo Paulo afirma que Deus não nos abandona em nossas aflições. Ele nos dá o seu Espírito como força que nos vivifica, que não nos deixa desesperar na consciência de nossa transitoriedade e de nossa fraqueza humana. Temos o Espírito Santo, que nos enche de esperança e nos fortalece para seguirmos na caminhada, sempre confiantes na presença do Senhor, para nos firmar e nos encorajar. Somos animados a orar por isso. O Espírito nos anima e faz “enxergar além do horizonte”. Ele firma a nossa fé e faz testemunhar a realidade daquilo que Cristo nos deixou como promessa: a vida plena e eterna. Movidos pelo Espírito Santo, “somos o pássaro que canta de madrugada, em plena escuridão, anunciando a chegada do novo dia” Isto não é obra nossa. É o espírito de Deus que nos fortalece do mesmo jeito como ele fez com os apóstolos no dia de Pentecostes.
É disso que nós precisamos na vida pessoal, com todos os seus conflitos e desesperos; na vida familiar, com todas as suas desagregações; na comunidade, que enfrenta crises de identidade; na sociedade, que perde cada vez mais seus valores éticos e morais. Nós precisamos desta força que nos arranca do medo, da descrença e do desânimo. Tocados, fortalecidos e reanimados pelo Espírito Santo, somos impulsionados a testemunhar e agir. Através do Espírito Santo, Deus quer preencher nosso coração com amor, coragem e determinação. Para tanto, nós precisamos nos reabastecer através da palavra de Deus, da oração, da vida em comunidade, da participação nos grupos comunitários e nas ações solidárias. Precisamos disso para ser voz profética e participativa na vida e na busca de soluções na sociedade. Somos corresponsáveis no cuidado e na preservação da boa criação de Deus. Precisamos deste reabastecimento espiritual. Deus quer nos tocar com seu Espírito, como fez no primeiro Pentecostes, como fez no nosso batismo, como o faz continuamente, dia após dia, em nossa vida.
Isso nos arranca do medo, do pessimismo, da descrença e da acomodação. Isso nos dá coragem e persistência para orar, crer, testemunhar, agir em benefício do bem-estar e da boa convivência entre as pessoas, e das pessoas com a boa criação de Deus. O Espírito Santo nos desperta, transforma, fortalece e envia. Então é Pentecostes em nossa vida pessoal e comunitária!
Resumindo: Sim, nós gememos enquanto conscientes de nossa transitoriedade neste mundo, também gememos diante da presença destruidora de violência, morte e mal. Gememos, envolvidos pelo pecado que agride a criação e ofende a Deus. Porém, não precisamos nos sentir abandonados. Deus nos envia o seu Espírito Santo , que geme conosco em oração, suplicando que o Senhor nos faça perceber que não estamos sozinhos. Nós somos seus filhos e suas filhas e somos destinados para uma vida plena e nova, da qual somos animados a dar testemunho aqui e agora. Somos animados a produzir os sinais de paz justiça e amor, de respeito à boa criação de Deus. Somos encorajados com a Boa Nova de Pentecostes. Deus nos dá o seu Espírito, que nos anima e encoraja para orar, para viver em união com Cristo e uns com os outros, produzindo os bons frutos do Espírito Santo (Gálatas 5.22). Ali onde o Espírito Santo se faz presente, ali percebemos a ação de Deus, a presença do seu amor e do seu cuidado. Então é Pentecostes! Isso nos anima a sair do medo e da acomodação, a abrir as portas trancadas de nosso coração e manifestar em palavras e ações o amor de Deus para todas as pessoas, revelado e vivenciado por meio de nosso Salvador Jesus Cristo!
Vem, Espírito de Deus!
Amém
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Pastor Em Geraldo Graf
g.graf@uol.com.br
São José do Rio Preto, São Paulo