Gálatas 4. 4-7

Gálatas 4. 4-7

PRÉDICA PARA A VÉSPERA DE NATAL 2023 | Gálatas 4. 4-7 | Alexander Busch |

Irmãs e irmãos em Cristo, querida comunidade.

Geralmente conhecemos a história de Natal a partir dos evangelhos escritos por Lucas e Mateus. Tanto Lucas como Mateus nos apresentam a história do nascimento de Jesus com ricos detalhes e um movimento dos personagens que nos encantam. Lucas e Mateus, de uma forma tão colorida e cheia de vida, destacam o contexto social, político e histórico em torno do nascimento de Jesus, a pequenina criança nascida em Belém. No entanto, existem, no Novo Testamento, ainda outras “histórias de Natal” – registros que também dão testemunho de Jesus. Um destes também nos é também bastante conhecido. No evangelho conforme João está escrito, “A Palavra se tornou um ser humano e morou entre nós, cheia de amor e de verdade. E nós vimos a revelação da sua natureza divina, natureza que ele recebeu como Filho único do Pai” (João 1.14).  Em vez de destacar o contexto histórico e social em que Jesus nasceu, João destaca a relação entre Jesus e o Pai e a humanidade – Jesus nasceu para revelar às pessoas quem é o Pai.

O texto bíblico em Gálatas que ouvimos hoje também é uma “história de Natal”. Quem nos escreve esta “história de natal” é o apóstolo Paulo. Paulo compartilha sobre o nascimento de Jesus, com a intenção de ajudar as comunidades cristãs que ficavam na região da Galácia – um antigo território do Império romano. Paula fala do nascimento de Jesus com as seguintes palavras: leitura do texto de Gálatas 4.4-7.

A carta de Paulo foi escrita para pessoas e comunidades cristãs onde existiam conflitos. As pessoas não estavam se entendendo e aceitando a partir da fé em Jesus Cristo. Um dos motivos para esta dificuldade era a própria diversidade que existia nas comunidades e como as pessoas entendiam a vivência da fé em Cristo.

As comunidades cristãs na região da Galácia eram comunidades mistas. Faziam parte as pessoas que não eram descendentes de judeus, vindas de outros povos, com suas tradições e costumes diferentes. Também faziam parte das comunidades pessoas cristãs vindas do judaísmo, com suas tradições e costumes. Eram, portanto, comunidades cristãs mistas com pessoas judaicas e pessoas não-judaicas. E por causa de diferentes costumes, diferentes leis e diferentes tradições as pessoas entravam em conflito. Não se encontravam no ponto comum: Jesus Cristo.

Além disso, os habitantes da Galácia estavam debaixo do domínio do Império Romano, sob o jugo das leis e política administrativa de Roma. E a estratégia política do Império Romano era “dividir para conquistar”, separando os diferentes grupos étnicos, promovendo a competição entre eles, sustentando uma firme hierarquia entre os diferentes povos, para governar sem oposição e melhor explorar os recursos dos diferentes povos na Galácia.  

É para este momento e contexto que Paulo escreve sua carta, de uma forma bem pastoral, buscando aproximar as pessoas umas das outras e promover o amor em Cristo nas comunidades. Por isso, o pastor Paulo escreve e afirma a grande novidade de Deus: o próprio Deus, em Jesus Cristo, vem ser nosso irmão e companheiro na jornada. Com Jesus algo novo e nunca visto tem seu início. Não são as leis, os costumes, e tradições humanas que nos aproxima de Deus, mas é Deus quem vem ao encontro das pessoas, “Deus enviou o seu próprio Filho, que veio como filho de mãe humana e viveu debaixo da lei para libertar os que estavam debaixo da lei, a fim de que nós pudéssemos nos tornar filhos (e filhas) de Deus” (Gl 4.4).

 

Aqui está o ponto central da mensagem de Natal. A criança nascida de mulher é Deus entre nós e Deus conosco. É Deus quem vem ao encontro da humanidade. É Deus quem vem ao nosso encontro para nos libertar das leis, das tradições e costumes, que muitas vezes usamos para justificar conflitos e separações, e sentimentos de superioridade. Pois Deus em Cristo aproxima as pessoas para formar uma só comunidade de irmãos e irmãs, independente de costumes, leis e tradições humanas. Em Cristo somos filhos e filhas de Deus e fazemos parte da mesma comunidade.

Esta é a novidade que Paulo insiste em trazer quando escreve sua carta aos Gálatas – uma novidade que aproxima as pessoas e gera comunhão. Nesta mesma carta Paulo escreve sobre isto dizendo, “vocês foram batizados para ficarem unidos com Cristo e assim se revestiram com as qualidades do próprio Cristo. Desse modo não existe diferença entre judeus e não judeus, entre pessoas escravas e pessoas livres, entre homens e mulheres: todos vocês são um só por estarem unidos com Cristo Jesus (Gl 3.27-28).

O que antes podia ser motivo para divisão perde sua força diante de Jesus Cristo. Se antes, as diferenças entre judeus e não judeus eram justificativas para conflito, agora em Cristo existe comunhão. Se antes, a lei de Roma, que fazia uso da circuncisão judaica para insistir na separação entre judeus e não-judeus, agora em Cristo existe uma lei maior que une os diferentes povos em amor e comunhão (conforme Gl 5.14; “Pois a lei inteira se resume em um mandamento só: ‘Ame os outros como você ama a você mesmo’”).

Se antes, as diferenças sociais entre uma pessoa livre e uma pessoa escrava separavam, agora em Cristo existe comunhão. E para entender bem o que Paulo está dizendo aqui, é preciso lembrar que no antigo Império Romano, uma boa parte da população exercia o trabalho escravo. Por causa de guerras, por causa de dívidas, ou outros motivos, pessoas eram obrigadas a servir como escravas. Na comunidade cristã, entretanto, pessoas livres – muitas delas proprietárias de pessoas escravas – eram acolhidas pelo mesmo batismo em Cristo e sentavam na mesma mesa de comunhão para compartilhar a ceia do Senhor. Tal atitude explica em parte a atração que as comunidades cristãs exerciam para com as pessoas de fora. Tal atitude explica em parte a perseguição do Império Romano, anos mais tarde, contra as comunidades cristãs que promoviam esta nova convivência entre pessoas livres e pessoas escravas.

Se antes as diferenças entre homens e mulheres eram desculpa para se achar superior, agora em Cristo existe igualdade de dignidade e respeito. Aqui também destacamos o que na academia recebe o nome de patriarcalismo. Na linguagem popular estamos falando de ‘machismo’, quando os homens se julgam superiores e melhores do que as mulheres. Na comunidade que segue a Jesus Cristo, porém, existem novas relações de respeito e dignidade entre homens e mulheres. Não há superioridade ou inferioridade porque todas as pessoas têm um novo e mesmo valor diante de Deus. 

E assim poderíamos prosseguir com a longa lista de costumes, leis e tradições humanas que, ao longo da história, muitas vezes, justificam conflitos, separações e sentimentos de superioridade. Tanto no mundo de Paulo como no nosso mundo, as pessoas insistem em usar costumes, tradições e leis para separar e jogar as pessoas umas contra as outras.

Através de Jesus Deus insiste e apresenta um novo jeito de viver em comunhão, uma nova vida em comunidade, onde as diferenças existem, mas perdem seu poder, porque Cristo nos aproxima, Cristo nos liberta, Cristo nos coloca numa nova relação com as pessoas ao nosso redor. Como escreve ainda o apóstolo nesta mesma carta, “O Espírito de Deus produz o amor, a alegria, a paz, a paciência, a delicadeza, a bondade, a fidelidade, a humildade e o domínio próprio” (Gl 5.22-23). Não é numa comunidade de outro mundo que o Espírito Santo de Deus está transformando a vida e relação entre as pessoas. É nesta comunidade aqui presente, onde o Espírito atua para transformar vidas e gerar comunidade – comunidade que vive a partir do Espírito, com valores que muitas vezes caminham na contramão dos valores de nossa sociedade, que cativa pessoas de fora para conhecer e caminharem com Jesus e sua igreja.

Portanto, diante desta grande novidade, a novidade do Deus que nos envia seu filho, nascido de mãe humana, a novidade do Deus que nos aproxima as pessoas, nos libertando de um mau uso das leis, costumes e tradições, do Deus que nos dá o seu Espírito para gerar filhos e filhas na mesma comunidade, que o natal seja oportunidade de rever atitudes, de pedir perdão, que o Natal seja oportunidade para buscar reconciliação e comunhão, oportunidade para servir e amar as pessoas nesta comunidade, oportunidade para servir e compartilhar o amor de Deus com todas as pessoas ao nosso redor e neste mundo. Amém.

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P.Me. Alexander Busch

Maripá -Paraná (Brasilien)

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