Isaías 62.1-5

Home / Bibel / Altes Testament / Isaías 62.1-5
Isaías 62.1-5

PRÉDICA PARA O 2° DOMINGO APÓS EPIFANIA – 16.01.2022. | Isaías 62.1-5 | Hans Alfred Trein |

Cara Comunidade de Jesus Cristo,

A passagem bíblica nos transporta para o século 6 antes de Cristo. Vamos mergulhar um pouco nesse tempo, para compreender bem, o que o nosso texto quer nos dizer.

  1. Depois de libertados da escravidão no Egito, quase 8 séculos antes, e de constituir-se como povo eleito de Deus, Israel acabava de passar pela experiência mais terrível da sua história até ali: seu templo tinha sido destruído, Jerusalém devastada, seus moradores deportados para o exílio na Babilônia. Naquele tempo, era comum que países militarmente mais fortes atacassem os mais fracos, para pilhar seus bens e escravizar o seu povo, sobrecarregando com pesados tributos eventuais estados vassalos. Desde a antiguidade, sempre há um império de plantão, para oprimir e explorar as nações mais fracas. Hoje em dia, os impérios se constituem de formas mais sutis e diplomáticas, oprimem pelo comércio, pelo financeirismo, pelos embargos… contam sempre com colaboracionistas nos países que exploram. Contudo, sempre tem o poderio militar aos fundos, para submeter quem não segue as regras que estabelecem, mesmo que para isso tenham que inventar mentiras, como a do gás de extermínio de massas, alguns anos atrás.

Para Israel essa experiência de ser derrotado e deportado de seu território sagrado era também uma derrota de seu Deus. Nas guerras de conquista da antiguidade, quem vencia era sinal, de que tinha o Deus mais forte. Então, podemos muito bem imaginar que o povo de Israel, no exílio, passou por uma grande crise de fé. Teve intenso sentimento de abandono, não tinha mais acesso ao seu local sagrado de culto. Será que ainda cabia permanecer na fé no seu Deus derrotado?

Depois de 49 anos no exílio, o império da Pérsia venceu o império da Babilônia, e o imperador vitorioso, Ciro, liberou os israelitas para retornarem ao seu país. Até ordenou e financiou a reconstrução do seu santuário e a devolução do inventário do templo (Edito de Ciro em Esdras 6.3-5). O templo de Jerusalém seria refeito como santuário estatal, como já fora nos tempos antes do exílio num claro uso político da religião.

Muita coisa tinha mudado nessa última geração. Dos que voltaram, muitos tinham nascido no exílio, só conheciam as tradições de ouvir os mais velhos contar. O novo normal dentro da política de tolerância do império persa precisava de muita criatividade. É nesse contexto, já na terra de Judá, que acontece a palavra profética do terceiro bloco (55-66) creditado a Isaías. O retorno dos exilados já ocorrera, mas não trouxera consigo a plenitude salvífica anunciada pelo segundo bloco de Isaías (40-55). O novo normal era de insegurança, perigos e grande carência. Havia muita frustração e desânimo. A reconstrução do templo ficou parada por 18 anos. Além disso, a dúvida maior: Deus ainda estava aí? O povo de Israel ainda era o seu povo eleito?

Vamos ouvir novamente o texto:

  1. Deus intervém. Segundo a Bíblia, a iniciativa é sempre dEle. Está vendo a desolação e conclui: esse pessoal não vai conseguir se levantar por conta própria. Decide interferir com “seu próprio braço” e “sua própria justiça”. A motivação? Por amor a Sião (o monte do templo) e Jerusalém que representam simbolicamente todo o povo. Se ele não intervir, a sobrevivência de Israel estará a perigo. O objetivo dessa intervenção é dar o pontapé inicial, “até que saia a sua justiça (de Israel) como um resplendor e a sua salvação como uma tocha acesa” para que todos, inclusive povos estranhos, possam ver. Ser luz para as nações, luz para os gentios. Essa é a vocação do povo de Deus (42.6; 49.6; Lc 2.32; At 13.47): construir uma sociedade modelo, na qual outras nações possam se espelhar. Pois um reino dividido em si mesmo é um reino enfraquecido; não subsistirá à dominação. Por falta de justiça, ou seja, vida digna para todos, Israel foi derrotado e foi parar no exílio. Isaías 1.21-23 o descreve de forma muito clara:

“Como se fez prostituta a cidade fiel! Ela que estava cheia de justiça! Nela habitava a retidão, mas, agora, homicidas… Os teus príncipes são rebeldes e companheiros de ladrões; cada um deles ama o suborno e corre atrás de recompensas. Não defendem o direito do órfão, e não chega perante eles a causa das viúvas…”

Só depois de feita uma profunda limpeza de toda a escória, “chamarão a (Jerusalém novamente) cidade de justiça, cidade fiel” (Is 1.26). Esse versículo expressa a esperança para depois do exílio. Com as devidas atualizações, qualquer semelhança com a realidade que conhecemos, não é mera coincidência.

Conseguir se reconstruir só será possível com justiça, condições de vida digna para todos, e isso resultará em salvação, não apenas para Israel, mas até as extremidades da terra (49.6). Inclusive implicará na mudança de identidade: Israel será como um povo novo. Deus lhe promete um novo nome. Como uma coroa de ornamento, Israel será admirado pelas outras nações. Como uma joia preciosa, um diadema real, aparecerá abrigado e protegido na mão do seu Deus.

Um problema sério daquele tempo precisava ser resolvido: a cidade vivia explorando o campo. Isso gerava injustiça, opressão, desigualdade. Em Jerusalém vivia o rei e sua corte, as forças armadas, os funcionários e sacerdotes do templo e serviçais. A cidade praticamente não produzia nada, além de alguns raros artesãos. A cidade vivia do que se produzia no campo. Essa relação era marcada pela extração à força. Por isso, também essa relação tinha que passar por uma profunda mudança, ser semelhante a uma relação matrimonial, harmoniosa e responsável. O versículo 8 registra:

“Nunca mais darei o seu trigo como alimento aos inimigos; nunca mais os estrangeiros beberão o vinho que tanto trabalho custou a você. Pelo contrário, quem colher o trigo também o comerá, louvando a Javé; quem colher as uvas, também beberá o vinho nos átrios do meu santuário”.

A economia de Deus é uma economia de gratuidade e suficiência. Todos os povos são convidados a participar desse tipo de economia que não é mais uma “camisa de força” de uns sobre os outros, nem de um país sobre outro, mas gratuidade de Deus. O PIB do Brasil, dividido pela população brasileira daria um ingresso médio de R$ 11.000,00 reais por família de 4 pessoas. Organizar a economia de tal forma que todos possam participar, essa é a nossa tarefa primordial, com a qual estaremos dando o maior louvor a Deus.

Três capítulos adiante o profeta descreve a sua visão em mais detalhes:

“Edificarão casas e nelas habitarão; plantarão vinhas e comerão dos seus frutos; não edificarão para que outros habitem; não plantarão para que outros comam” (65.21s).

Não trabalharão por um salário miserável, (com uma seguridade social precarizada), nem terão filhos para a calamidade (23 a+b). Nunca mais chamarão Jerusalém de desamparada, nem o campo de desolado.

  1. O que podemos aprender dessa passagem bíblica? Algo que não seja apenas uma história curiosa do passado, mas algo que seja importante para nós, hoje:
  • O país modelo para as outras nações, nunca se realizou. A aspiração de sê-lo, como o reino milenar pretendido por Hitler, resultou num grande fiasco desumano; O american way of life, propagado por quem se considera atualmente o povo escolhido de Deus, ainda vai levar nosso planeta à ruína.
  • Embora tenhamos que lutar por melhorias nas políticas públicas, nações, organizadas como sociedades de Estado, nunca realizarão a função de modelos de justiça para outras nações, pois são marcados por sérios vícios de origem, violência e imposição militar, corrupção e interesses corporativos em sua realização. O Estado ideal é um sonho, um desejo ardente, mas está fora da história. República é menos ruim do que monarquia. “…democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais que têm sido experimentadas de tempos em tempos…” (Winston Churchill). A sociedade de Estado precisa ser superada! Jesus pregou o Reino de Deus.
  • Jesus pode ser entendido como o servo sofredor profetizado por Isaías. Ele é a intervenção de Deus, promessa cumprida com datas, lugares e nomes. Assim o velho Simeão o reconheceu em Lucas 2.32. Assim o próprio Jesus afirmou que se cumpriam as profecias de Isaías, quando leu o capítulo 61, na sinagoga de Nazaré (Lc 4.21).
  • O profeta Isaías ainda sonhava com uma nação-modelo. Jesus é, num grau jamais sonhado pelo profeta, a intervenção cabal de Deus para o seu povo que agora não se resume mais ao povo de Israel, mas é ampliado para toda a humanidade. Talvez por isso, o novo nome.
  • As comunidades cristãs poderiam assumir a tarefa de organizar, em grupos limitados, uma convivência econômica- e socialmente justa, ambientalmente sustentável, reconciliada e amorosa, para servir de modelo a outros grupos ou “tribos” modernas. As comunidades cristãs primitivas conseguiram exemplificar isso, como descrito em Atos 2 e 4. Para isso, tem de inspirar-se em Jesus, sua humildade, seus valores e sua confiança no Deus Pai e tem de desistir do individualismo exacerbado originado, como efeito colateral, pela produção industrial.
  • Como demonstraram as comunidades de algumas favelas durante a pandemia: é possível sobreviver melhor, do que disputar individualmente carcaças e ossos, quando a gente empobrecida se une e compartilha o pouco que tem. Já das classes médias e ricas é mais difícil esperar esse compartilhamento, como já dizia o próprio Jesus.

Como nos tempos de Isaías, temos urgência. Não percamos mais tempo!

Amém.

 —

Sugestão de Cânticos:

HPD I 160 Cantai ao Senhor, um cântico novo

LCI 176 Dizei aos cativos saí (HPD II 435)

P. Me. Hans Alfred Trein

São Leopoldo – Rio Grande do Sul (Brasilien)

hansatrein@gmail.com

de_DEDeutsch