PRÉDICA PARA O DIA DA REFORMA

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PRÉDICA PARA O DIA DA REFORMA

PRÉDICA PARA O DIA DA REFORMA – 31 de outubro de 2020 | Texto bíblico: Gálatas 5. 1-11 | Geraldo Graf |

Neste dia em que celebramos 503 anos da Reforma, eu saúdo as irmãs e os irmãos com a palavra de Jesus contida em Lucas 4.18-19: “O Senhor me deu o seu Espírito. Ele me escolheu para levar boas notícias aos pobres e me enviou para anunciar a liberdade aos cativos, dar vista aos cegos, libertar os que estão sendo oprimidos e anunciar que chegou o tempo em que o Senhor salvará o seu povo.”

Queridos irmãos e queridas irmãs em Cristo!

O texto bíblico de Gálatas 5.1-11 inicia com as seguintes palavras: “Cristo nos libertou para que sejamos definitivamente livres”. Podemos observar que a palavra-chave do texto é LIBERDADE. Porém, antes de tecermos conceitos pessoais, precisamos descobrir de qual liberdade o apóstolo Paulo está falando, já que existem muitas interpretações diferentes e contraditórias do que vem a ser liberdade.

Existe o desejo individual inato, que faz com que a pessoa queira se ver livre de qualquer tipo de autoridade, jugo, condução ou interferência em sua vida. É o caso típico de adolescentes em relação aos seus pais, de pessoas em relação às autoridades, em relação às convenções sociais. Quando existe uma placa dizendo “não pise na grama”, aí mesmo que as pessoas pisam de propósito para mostrar que ninguém manda nelas. As pessoas querem decidir sozinhas sobre o que querem e podem fazer. Por isso, acabam repetindo erros e transgressões por causa de atitudes egoístas e anti- sociais, que são confundidas com liberdade.

 

Para muitas pessoas, ser livre é ser como um passarinho solto, que pode voar aonde e quando bem entender, sem precisar dar satisfação de seus atos para ninguém. Podemos chamar este comportamento de liberdade individualista. De longe, ela ainda não é a liberdade cristã da qual fala o texto bíblico.

Segundo os dicionários, liberdade é o grau de independência que uma pessoa, um povo ou uma nação elegem como bem supremo. Liberdade é o conjunto de direitos reconhecidos ao indivíduo, isoladamente ou em grupo. É o poder que a pessoa tem de exercer sua vontade dentro dos limites que lhe faculta a lei. Ou seja: sou livre para fazer o que eu quero, desde que isso não prejudique a convivência com outras pessoas, provoque escândalo ou ameace a vida do próximo. Sou livre, mas preciso me ater às regras sociais estabelecidas. Por exemplo, preciso respeitar a vida, a propriedade legitimamente adquirida e, por exemplo, não posso sair nu passeando pela rua afora. É como afirma o apóstolo Paulo em 1 Coríntios 6.12: Posso fazer qualquer coisa, mas nem tudo é bom”.

Liberdade é a palavra de ordem de quem se sente escravizado, oprimido e explorado. É a bandeira das revoluções (veja a Revolução Francesa, a Inconfidência Mineira, etc.). É o grito por direitos e oportunidades iguais para todas as pessoas.

A liberdade é um direito inviolável. Na Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, também assinado pelo Brasil, fica estabelecido que:

Art. 1º – Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos.

Art. 2º – Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e a liberdade estabelecidos nesta Declaração.

Art. 3º – Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

Na Constituição Brasileira está garantido que:

Art. 3º – Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I – Construir uma sociedade livre, justa e solidária.

Art. 5º – Todas as pessoas são iguais perante a lei… garantindo-se a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

 

Ao falar de liberdade cristã, o apóstolo Paulo vai um pouco além dos direitos fundamentais da liberdade humana:

Paulo escreveu a Carta por volta de 54-56 a. D. para uma comunidade na Galácia, região central da Ásia Menor, atual Turquia. A maioria dos membros da comunidade era de origem gentílica, ou seja, não era proveniente do Judaísmo. Paulo ficou sabendo que cristãos de origem judaica estavam convencendo os Gálatas da necessidade de se submeterem às leis judaicas se quisessem obter a graça divina. Deveriam seguir as leis do Pentateuco, e entre as quais estavam a observância do sábado e a prática da circuncisão. Paulo esclareceu aos Gálatas que, o que Jesus Cristo fez por todas as pessoas na cruz, é suficiente para aproximá-las do amor de Deus. A única condição é aceitar esta libertação por meio da fé.

 

Aquilo que Paulo escreveu aos Gálatas também vale para nossos dias. Precisamos estudar e interpretar o Antigo Testamento a partir da nova aliança que Deus fez conosco por meio de Jesus Cristo. Precisamos olhar para as leis do Pentateuco com os óculos do Evangelho. Descobriremos que Jesus deu total importância aos dez mandamentos, que são leis éticas universais, e submeteu as demais regras ao Grande Mandamento do amor a Deus e do amor ao próximo (Mateus 22.36-40). Que regras são essas? Leis morais sobre comidas e bebidas, vestimentas, dias festivos, sacrifícios, costumes, etc: Comida, bebida, dias santos, lua nova, sábado (Colossenses 2.16). Os judeus haviam desdobrado toda a lei em 613 regras, cada vez mais difíceis para serem cumpridas pelo povo (veja as discussões de Jesus com os fariseus). Tornou-se uma decisão difícil socorrer uma pessoa doente ou machucada em dia de sábado, por exemplo.

 

Fazendo a leitura correta do Evangelho de Cristo, sobretudo do Sermão do Monte, Paulo deixou claro que, para ser cristã e se sentir agraciada por Deus, a pessoa não precisava se submeter às regras judaizantes. Vivenciar a fé em Jesus Cristo era suficiente. Fazendo uma comparação, imaginem uma pessoa aqui no Brasil, para se tornar luterana, tivesse que aprender primeiro a falar alemão e assumir todos os costumes germânicos. Algo parecido a isto estava sendo proposto aos Gálatas e que Paulo corrigiu.

O apóstolo Paulo testemunha que a justiça de Deus, que nos é oferecida por meio de Jesus Cristo, é suficiente para nos libertar e salvar. Ter fé é confiar plenamente na graça e no amor de Deus, que nos liberta e salva. “Jesus Cristo nos libertou para que sejamos verdadeiramente livres” – Gálatas 5.1

 

Os cristãos do século XVI novamente viviam debaixo do jugo de regras, que extrapolavam os ensinamentos bíblicos: adoração de relíquias, compra de indulgências, autoridade da Igreja, etc.  Apontando para o centro libertador do Evangelho, que é Jesus Cristo, e para a prática desta liberdade, em 1520, Martim Lutero escreveu o livro “Da Liberdade Cristã”. No mesmo, ele afirma: “Uma pessoa cristã é senhora livre sobre todas as coisas e a ninguém submissa. Mas ao mesmo tempo, uma pessoa cristã é serva prestativa em todas as coisas e está sujeita a todos”. Em outras palavras: Nós somos livres de tudo por meio da fé em Jesus Cristo. Mas, simultaneamente estamos a serviço uns dos outros por meio do amor ao próximo. Por um lado, somos totalmente livres através do grande presente que recebemos por meio do sacrifício de Cristo na cruz. Por isso, não precisamos mais nos submeter aos rituais escravizantes para conquistar a graça de Deus. O que Cristo fez é suficiente. Por outro lado, somos orientados a não cruzar os braços numa atitude de liberdade egoísta, individualista. Somos libertados e enviados para usar nossa liberdade, investindo-a no amor ao próximo. Em 1 João 4.19 está escrito: “Nós amamos porque Deus nos amou primeiro”. É exatamente isto que nos aproxima da recomendação de Gálatas 5.6: “A fé se torna ativa por meio do amor”. Martim Lutero concluiu em seu livro: “Uma pessoa cristã não vive para si mesma, mas para Cristo e para o próximo, Para Cristo, por meio da fé; para o próximo, por meio do amor”.

Portanto, a liberdade cristã é relacional e nos compromete. Nós só nos sentiremos verdadeiramente livres na união com Jesus Cristo pela fé, e na partilha desta liberdade por meio da prática do amor ao próximo. A liberdade cristã existe porque Deus quebra todas as correntes pecaminosas que nos escravizam. Porém, ela é uma liberdade que compromete. Em Romanos 6.18, o apóstolo Paulo escreve: “Vocês foram libertados do pecado e agora estão inteiramente a serviço de Deus para fazer o que é direito”. Portanto, somos livres de todas as amarras pela fé em Jesus Cristo, mas, por amor, nós nos submetemos às regras sociais de convivência humana, que visam ao bem-estar das pessoas, à preservação da vida (das pessoas e de toda a natureza). E o fazemos por amor e gratidão.

 

Na condição de comunidade cristã luterana, vivenciamos os propósitos da Reforma ao aceitarmos o chamado de não permanecermos indiferentes ou trancados no egoísmo de uma falsa liberdade; mas de crermos firmemente que somos libertados por meio de Jesus Cristo. Nisto nos ancoramos. Como resultado disso, vivenciamos uma fé ativa no amor. Somos livres para amar e servir!

Resumindo: Liberdade cristã não é liberdade individualista, Liberdade cristã é relacional e comprometida:

Pela fé, vivemos em união com Jesus Cristo, que nos liberta de todos os jugos. Somos livres para crer!

Pelo amor, vivemos em união com o próximo, com quem partilhamos as dádivas divinas. Somos livres para amar e servir!

 

Concluo com mais uma palavra de Martim Lutero:

Eu devo ser para o próximo aquilo que Cristo é para mim e oferecer-lhe tudo o que é necessário, útil e abençoado, assim como eu tenho plenitude das coisas pela fé em Cristo. Da fé jorra o amor a Deus, e do amor jorra uma vida marcada pela liberdade, pela boa vontade e pela alegria em servir ao próximo. Pois, da mesma forma como nosso próximo passa dificuldades e necessita daquilo que temos de sobra, assim nós passamos necessidade diante de Deus e somos dependentes de sua graça. Por isso, assim como Cristo nos ajudou gratuitamente, assim não devemos fazer outra coisa que ajudar nosso próximo através de nosso corpo e suas obras.

Amém.

Pastor Em. Geraldo Graf

g.graf@uol.com.br

São José do Rio Preto/São Paulo

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